Dirigente da Anvisa disse, de fato, que dados de imunogenicidade - a capacidade que uma vacina tem para induzir o sistema imunológico a produzir anticorpos - da CoronaVac eram inadequados
Itamar Aguiar/Palácio Piratini
Por: Redação
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Publicado em 22.01.2021 | 18:03 | Alterado em 22.11.2021 | 16:38
- Enganoso
- Dirigente da Anvisa disse, de fato, que dados de imunogenicidade – a capacidade que uma vacina tem para induzir o sistema imunológico a produzir anticorpos – da CoronaVac eram inadequados. A Anvisa explicou, no entanto, que não há questionamentos em relação à segurança da vacina.
São enganosos os posts no Twitter que lançam dúvidas sobre a CoronaVac por conta de seus dados de imunogenicidade – a capacidade que uma vacina tem para induzir o sistema imunológico a produzir anticorpos. A CoronaVac foi aprovada para uso emergencial no Brasil no dia 17 de janeiro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). As postagens colocam em dúvida a eficácia e a segurança da vacina com base em uma declaração do gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, que disse que os dados de imunogenicidade da CoronaVac eram inadequados.
De fato, Gustavo Mendes usou estas palavras durante uma entrevista concedida ao portal UOL em 17 de janeiro, para se referir aos dados apresentados pelo Instituto Butantan em relação à imunogenicidade da CoronaVac. Mas, o gerente-geral também disse que a inadequação estava no fato de os dados serem qualitativos e não quantitativos.
Por e-mail, a Anvisa explicou ao Comprova que não há questionamentos em relação à segurança da CoronaVac. O que faltou foi a apresentação dos dados detalhados sobre a metodologia do teste de imunogenicidade, além da informação de como se deu a evolução dos anticorpos no grupo que tomou a vacina em relação ao grupo que tomou placebo.
O Butantan assinou um termo de compromisso e tem até 28 de fevereiro para enviar os dados complementares à Anvisa. Essas informações são importantes para saber a eficácia da vacina para grupos diferentes como idosos, jovens, pessoas com comorbidades e entre aqueles que já foram infectados, por exemplo.
Inicialmente, procuramos especialistas que explicassem o que é a imunogenicidade de uma vacina e qual a situação da CoronaVac em relação a esse dado. Para isso, ouvimos o imunologista André Báfica, coordenador do Laboratório de Imunobiologia no Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (MIP) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e Flávio Fonseca, coordenador do CT-Vacinas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia (SBV).
Também consultamos o dicionário de conceitos da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
Entramos em contato com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para esclarecer o significado da fala do gerente Gustavo Mendes e procuramos o Instituto Butantan para que explicasse que dados ainda precisam ser enviados à Agência.
Também procuramos os autores dos tuítes que viralizaram. Segundo eles, as informações divulgadas em seus perfis são baseadas em uma matéria do UOL e comunicados da Anvisa. Com um dos três autores não conseguimos contato. No entanto, em seu perfil ele também compartilha as afirmações tirando de contexto os dados publicados pela Anvisa na apresentação da Coronavac.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 22 de janeiro de 2021.
Imunogenicidade é a capacidade que uma vacina tem induzir respostas imunes protetoras contra um organismo infeccioso, conforme explica o imunologista André Báfica, coordenador do Laboratório de Imunobiologia no Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (MIP) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Em outras palavras, é a capacidade que uma vacina tem que induzir o sistema imunológico a produzir anticorpos. Para afirmar que a imunogenicidade de uma vacina é de 100%, é preciso que todas as pessoas vacinadas tenham desenvolvido anticorpos. Se, por exemplo, metade das pessoas os desenvolveu, a imunogenicidade é de 50%.
Mais do que produzir anticorpos, uma alta imunogenicidade aponta que os anticorpos são bons. “Quanto mais imunogênica é uma vacina, mais anticorpos ou mais células de defesa, anticorpos de melhor qualidade, células de defesa de melhor qualidade são produzidas. Uma vacina muito imunogênica é uma vacina que produz muitos anticorpos e bons anticorpos, muitas células de defesa e boas células de defesa. Quando eu falo boas são anticorpos e células de defesa adequados ao combate ou o reconhecimento do patógeno contra o qual se vacinou”, detalha o professor Flávio Fonseca, coordenador do CT-Vacinas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Segundo a Anvisa, os dados de imunogenicidade apresentados pela CoronaVac são inadequados porque são qualitativos e não quantitativos. Segundo a agência, é preciso que o Instituto Butantan apresente a metodologia e os detalhes de como os testes de imunogenicidade foram feitos.
O Instituto Butantan foi procurado pelo Comprova, mas não respondeu até a publicação desta verificação. Em agosto, no entanto, publicou um release em que afirmava que a Coronavac “se mostrou segura e com bom índice de imunogenicidade”, com base em um estudo que analisou o comportamento de 600 voluntários vacinados na China.
Os dois especialistas ouvidos pelo Comprova, no entanto, afirmam que os dados de imunogenicidade da CoronaVac são bons. “No caso da covid-19, uma doença viral, a resposta imune protetora aferida em ensaios de vacinas é baseada principalmente na produção de anticorpos neutralizantes. Levando isso em consideração, 100% dos voluntários que foram vacinados em ensaios de fase clínica 2, vacinação nos dias 0 e 28, tiveram anticorpos neutralizantes. Esta resposta se mostrou adequada para que a vacina entrasse em estudos de fase 3”, explica André Báfica, da UFSC.
Báfica usa como base os dados divulgados em um artigo publicado em 17 de novembro de 2020 na The Lancet pelos pesquisadores chineses Yanjun Zhang, PhD em Microbiologia e pesquisador do Centro Provincial de Zhejiang para Controle e Prevenção de Doenças; Gang Zeng, também PhD, ligado ao laboratório Sinovac Biotech; Hongxing Pan, do Centro Provincial de Jiangsu para Controle e Prevenção de Doenças; Changgui Li, dos Institutos Nacionais de Controle de Alimentos e Medicamentos, em Pequim, na China; Yaling Hu, da Sinovac Biotech; e Kai Chu, do Centro Provincial de Jiangsu para Controle e Prevenção de Doenças.
O artigo mostra os dados de imunogenicidade da CoronaVac para adultos saudáveis entre 18 e 59 anos, nas fases de 1 e 2 de testes, controladas por placebo. Foram estes dados de imunogenicidade que apontaram que a vacina era segura para seguir para a fase 3 de testes. Os dados mostram que houve “soroconversão [produção] de anticorpos neutralizantes” em 100% das pessoas que fizeram uso da dose alta da CoronaVac ao final dos testes, enquanto a geração de anticorpos neutralizantes no grupo que fez uso do placebo foi de 0%.
O professor André Báfica explicou que, em tese, os dados de imunogenicidade podem variar de acordo com o país em que os testes foram feitos, mas isso é raro.
De acordo com dados divulgados pelo Instituto Butantan em 12 de janeiro, a CoronaVac obteve 50,38% de eficácia global no estudo clínico desenvolvido no Brasil, índice superior ao exigido pela OMS (Organização Mundial de Saúde). Além disso, o imunizante apresentou 78% de proteção em casos leves e 100% em casos moderados e graves da covid-19. Neste último critério, ainda não há significância estatística para ter certeza sobre o dado, então mais observações precisam ser feitas.
Para a Anvisa, não há dúvidas quanto à segurança da vacina, já que as informações colocadas como “inadequadas” dizem respeito à imunogenicidade e são necessárias para se conhecer a eficácia da vacina em grupos com perfis diferentes, como idosos, jovens, pessoas com comorbidades e entre aqueles que já foram infectados previamente e os que não foram.
O professor Flávio Fonseca, coordenador do CT-Vacinas-UFMG, discorda que os dados do imunizante produzido pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chines Sinovac, sejam inadequados: “As formas que os cálculos foram feitos são corretos, e mostra que é uma vacina com um potencial de proteção, uma eficácia global limitada, mediana apenas. Mas ela tem eficácia em evitar o surgimento de casos graves, leves e moderados, o que nesse momento de emergência sanitária justifica o uso emergencial dessa vacina”, concluiu.
Em relação à segurança da vacina, de acordo com o documento de autorização de uso emergencial da CoronaVac, apresentado pela Anvisa em 17 de janeiro, a reação mais comum observada após a aplicação da segunda dose da vacina foi dor no local, que ocorreu em 40,1% dos adultos e 27,8% dos idosos.
Importante dizer que neste momento a vacina aprovada para uso emergencial não pode ser aplicada em pessoas com menos de 18 anos, naqueles que já apresentaram reação anafilática confirmada a qualquer componente da vacina, pessoas com sintomas ou suspeita da covid-19 e em gestantes apenas após avaliação médica.
Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus que tenham grande alcance nas redes sociais.
Os conteúdos verificados somavam até o fim desta reportagem quase 20 mil interações no Twitter. Publicações como essas não têm fundamentos e servem apenas para assustar a população acerca das vacinas e outras medidas que contribuem no combate da disseminação do vírus da covid-19. A vacina já teve sua eficácia comprovada, e as outras recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), como o uso de máscaras, seguem sendo as únicas medidas preventivas contra o coronavírus.
O Comprova já verificou outros conteúdos que propagam a desinformação em torno das vacinas, como as postagens enganosas que dizem que os vacinados pela CoronaVac estarão protegidos pela metade, que eficácia da CoronaVac seria apenas 0,38% superior ao placebo, também foi apontado como falso o post que dizia que enfermeira que recebeu a primeira dose da CoronaVac já estava imunizada.
Enganoso, para o Comprova é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
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