Apresentador faz pelo menos cinco entrevistas na semana com as principais figuras da região, e quer impulsionar novos programas para trazer informação e reflexão na quebrada
Arquivo pessoal
Por: Leonardo Siqueira
Notícia
Publicado em 19.03.2025 | 13:56 | Alterado em 19.03.2025 | 13:57
Após mais de 400 entrevistas, Carlos França, popularmente conhecido como Junior, 32, se tornou um importante comunicador em Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo, ao trazer para o público vozes relevantes da região, no Dequebrada podcast.
Mas o apresentador quer ir além das entrevistas e está buscando projetos para continuar a agregar valor para a cidade. “O objetivo é trazer mais liberdade para a quebrada através da informação”.
Criado no bairro da Vila Jamil, um dos últimos bairros a receber asfalto na cidade, Júnior começou trabalhando como motoboy aos 18 anos em uma pizzaria que mais tarde seria dele. Contudo, o estabelecimento fechou sem superar as dívidas herdadas. Depois, ele entrou em empresas de Call Center até passar a viver do podcast.
Em 2020, nasceu o Dequebrada podcast, pioneiro em Ferraz. O episódio inaugural foi ao ar em uma casa de dois cômodos, na Vila São Paulo, com uma webcam e um microfone emprestado de um amigo.
Depois de uma tentativa frustrada de fazer lives na plataforma Twitch, Junior – que acompanhava diversos podcasts – decidiu criar o próprio programa. A escolha do nome foi uma forma de representar a história dele e gerar identificação com quem assistia.
‘Sempre fui um cara criado na favela e tal, na comunidade. Passei por muita dificuldade na vida. Então meio que eu me identifiquei com esse nome’
De forma descontraída, o entrevistador dita o ritmo da conversa. “Para mim, tudo o que eu tenho é a minha bagagem. Deixo acontecer, porque o conteúdo em si é vivo”, afirma.
Focado em empreendedorismo na cidade, Junior busca vozes relevantes da região para comentar sobre os principais assuntos da semana.
Em momentos de desinformação, como o da disseminação da fake news sobre a taxação do pix, o secretário de desenvolvimento econômico de Ferraz, Thiago Severo, foi convidado para esclarecer o assunto.
O podcast já recebeu nomes como o kickboxing Esquivinha, quatro vezes campeão panamericano; o comediante Maicon Sales (conhecido por imitar a Ana Maria Braga); e o professor Vagner Marques, autor do livro Fé e Crime, que conta a relação do pentecostalismo na vida de membros de facção.
Em 2021, o professor estava escrevendo a biografia de Mc Kevin quando o projeto foi interrompido pela morte do cantor.
Vagner Marques é doutor em história social e participou do programa mais de cinco vezes, uma delas foi para explicar como iniciou a guerra entre Israel e Palestina. No início da transmissão, ele destacou sobre a importância do Dequebrada para Ferraz.
“É necessário que a gente tenha ações fragmentadas que valorizam a iniciativa local, de protagonismo local, reflexão local, de percepção do mundo a partir daqueles que estão nos locais (…) a quebrada deve ter os seus próprios meios reflexivos”, pontuou Marques.
Junior não só busca os convidados, ele recebe diversas propostas para entrevistar artistas locais, empresários, políticos e pessoas que estão crescendo na região. Ao mesmo tempo, quer mapear as iniciativas da cidade e divulgar para todo o Alto Tietê.
‘O que eu posso agregar para o convidado é visibilidade, espaço e oportunidade dele criar um conteúdo de valor. Porque ele vem no podcast e agrega valor para a vida das pessoas’
Hoje, o Dequebrada conta com estúdio próprio e recebe outros seis podcasts. Juninho afirma que o programa tem alcance de um milhão de espectadores mensais, distribuídos nas plataformas da Meta, Youtube, Spotify e Kwai – todas monitoradas rigorosamente por ele.
Mas nem sempre foi assim, até junho de 2024, Junior trabalhava na área de recursos humanos de um Call Center e usava parte do salário para financiar o programa. Segundo ele, a profissionalização foi o maior desafio.
“Quando você não tem um ar profissional, as pessoas não te tratam como profissional. Independente de ser dentro de casa ou não, tudo vai da sua postura. Porque normalmente você é CLT e faz isso nas horas vagas, aí acaba sendo mais livre”, conclui.
Junior entrevistou a prefeita Priscila Gambale, Dr. Rafú Jr e outros candidatos em seu antigo estúdio adaptado @Arquivo pessoal
Somente ao enxergar o Dequebrada como projeto profissional que tudo começou a mudar. Segundo pesquisa da ABPOD (Associação Brasileira de Podcast), realizada em 2024, com 352 respostas, 57,5% dos produtores financiam seus projetos com recursos próprios, enquanto 18,75% monetizam por meio de patrocínios ou publicidade.
Contudo, a maior parte da receita do Dequebrada vem do patrocínio das empresas da região. Além do comércio, a população encontra informação do que está acontecendo em Ferraz.
“Ele é importante para o conhecimento das pessoas da cidade. E funciona mais como veículo de notícia”, diz Thayna Santos, 29, hair stylist (estilista de cabelo) e telespectadora do programa.
Outra fonte de renda são os demais programas que compõem a grade, dentre eles o Ninguém me Cala, da dançarina Amanda Mahasin, 31. Ela conheceu o Junior quando precisava divulgar um evento de dança, e passou a alugar o estúdio. “O objetivo (do podcast) é contar histórias além da política da nossa cidade, os outros podcasts só querem fomentar política”, comenta Amanda.
Nas eleições de 2024, Junior entrevistou os principais candidatos da região e deu espaço para eles mostrarem suas propostas. Antes os moradores de Ferraz acompanhavam as próprias redes sociais dos políticos ou a TV Cenário – principal veículo de comunicação da cidade. “Eu fiz o trabalho de entrevistar grande parte dos candidatos à prefeitura e à câmara da região de Suzano, Itaquá e Ferraz ”.
Junior quer investir em novos projetos e preencher a agenda do estúdio com podcasts novos. Em 2021 e 2024, ele foi vencedor do prêmio de melhor programa de podcast pela premiação independente Planet Records Awards. E estimula os artistas a fomentar os veículos locais.
“Entenda a sua realidade. Cada coisa no seu lugar. Se você é um artista que está começando, você tem que valorizar os veículos que estão do seu tamanho”.
Jornalista, fotógrafo e designer que busca dar voz para quem pouco teve. Apaixonado por histórias, fotografia, cinema, livros e adora uma dança. Curioso que só! Um pouquinho cético, ama conhecer espaços diferentes e adora ir para o litoral, de dia para ver o mar e de noite para observar as estrelas. Correspondente de Ferraz de Vasconcelos desde 2022.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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