Léu Britto/Agência Mural
Por: Gabriela Carvalho
Notícia
Publicado em 19.04.2023 | 16:08 | Alterado em 19.04.2023 | 16:08
“É engraçado que a gente ainda não consegue delegar algumas tarefas aos homens”, diz Maria Luiza Paixão, 60, professora aposentada e moradora da Cidade Líder, na zona leste de São Paulo. Ela exemplifica a realidade de muitas mulheres retratadas pela pesquisa “Viver em São Paulo: Mulheres”.
Segundo o levantamento, realizado pela Rede Nossa São Paulo e divulgado no último mês de março, em quase metade dos lares da capital paulista (45%), as mulheres são totalmente responsáveis ou assumem a maior parte das tarefas domésticas.
Maria conta que, na casa dela, os afazeres são divididos com o filho de 37 anos, mas algumas responsabilidades ainda são destinadas apenas a ela. No caso dela, a moradora vê a reprodução da ideia de que a mulher leva mais jeito para determinadas coisas.
“Meu filho lava o banheiro, tira o lixo, faz a comida se precisar, mas a louça, as compras, a manutenção da casa e as roupas ficam comigo. Principalmente porque o homem não cuida direito da roupa, né? Na verdade, não cuida porque não quer”, comenta.
Ainda de acordo com a pesquisa da Rede Nossa São Paulo, entre as tarefas mais realizadas pelas mulheres, estão o preparo de refeições, a limpeza da casa e o cuidado com a louça. Já entre os homens, a responsabilidade mais mencionada é a louça, seguida do preparo de refeições e das compras.
Para Maria Luiza, também existe o fato da mulher achar que tem mais obrigação dentro de casa. “Às vezes, a gente fica nessa de querer poupar o homem e acaba se colocando mais à disposição, mesmo que se prejudique.”
“A mulher aprende que é responsabilidade dela. Isso não justifica, mas é a forma que fui criada e, consequentemente, criei meus filhos”, complementa.
O levantamento também mostra que, em 16% dos lares da capital, os serviços domésticos são responsabilidade apenas das mulheres; em 29% são divididos entre homens e mulheres, mas a mulher ainda faz a maior parte; enquanto que, em 36%, as tarefas são distribuídas igualmente.
Desses 36%, a maior parte das respostas vem de mulheres de 16 a 24 anos. É o caso da consultora de projetos Karina Fernandes Rocha, 23, que mora com o noivo há um ano e quatro meses no Jardim Vila Formosa, bairro do Aricanduva, também na zona leste.
Ela conta que, apesar do noivo nunca ter aprendido a realizar os deveres domésticos antes, desde que foram morar juntos, ele tem se interessado no tema. “Eu fazia o cronograma de limpeza da casa e ele sempre falava que queria uma atividade. Acabei colocando coisas mais fáceis, como dobrar a roupa e levar o lixo”, diz.
Com a rotina de home office, Karina tinha mais responsabilidades em casa, já que o noivo trabalhava fora e ainda estava na faculdade, enquanto que ela já era formada. Porém, agora que ele também trabalha em casa, as coisas mudaram. Hoje, o noivo já faz praticamente todas as tarefas, com exceção de lavar roupa.
“Antes, eu fazia muito mais coisas porque achava mais certo devido à dinâmica de horários. Mas a gente foi adaptando, fui dando tarefas para ele aos poucos e agora ele está aprendendo a cozinhar”, explica. “Ele ainda tem medo de manchar as roupas, então quando vou sair ou trabalhar fora, coloco na máquina e ele estende.”
Até mesmo para quem reflete mais sobre a igualdade na divisão de tarefas, parece que a cobrança está sempre presente. “Existe esse sentimento de que as coisas ficam mais perfeitas quando eu faço”, conta Karina.
“Por essa questão enraizada de que mulher faz melhor, não que eu acredite nisso, mas é muito mais fácil fazer do meu jeito do que ensinar a limpar determinada coisa”
Karina Rocha, consultora de projetos
Ela relata que já viu de perto essa cultura enraizada na sociedade. “Minha mãe sempre foi condenada a fazer tudo e meu pai não. Eu mesma já tive outros relacionamentos onde pedi para a pessoa lavar o copo que usou e ela dizer: ‘mas você não pode lavar?’”
Essa visão também é enfatizada por Maria. “É uma questão de cultura. Onde tiver um homem e uma mulher, algumas tarefas vão ser destinadas à mulher, parece que já é pré-estabelecido. É dito que, para algumas atividades, a mulher tem mais jeito”, finaliza.
Jornalista, comunicadora visual, mestra em Mídia e Tecnologia e pós-graduada em Processos Didático-Pedagógico para EaD. É correspondente do Jardim Marília desde 2019. Também é cantora de chuveiro, adora audiovisual e é louca por viagens.
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