Por: Bruna Nascimento
Notícia
Publicado em 17.03.2025 | 16:34 | Alterado em 17.03.2025 | 16:34
A bióloga Wanda Ziviani Alcântara, 44, mora no bairro Quaresmeira, em Suzano, Grande São Paulo, há 8 anos, com o marido Norberto, 44, os filhos Fabrício, 13, Rubens, 15 e Julia, 18. No entanto, os ocupantes mais curiosos e numerosos da casa são as colônias de mais de 10 espécies diferentes de abelhas.
Em pleno bairro urbano, a prática responsável de meliponicultura, que é a criação de abelhas sem ferrão, proporciona à família uma renda extra a partir da venda de mel e outros produtos derivados das abelhas como própolis, favo e até mesmo uma cerveja com mel na composição.
Mas o negócio familiar, que ganhou o nome de ‘Conexão Abelhudos’, vai além da comercialização. Eles também oferecem oficinas e palestras sobre as abelhas, como criar, quais possibilidades de empreendedorismo por meio delas e a importância ambiental desses insetos.
A família transmite conhecimentos e curiosidades sobre o tema por meio de uma página no Instagram e canal no YouTube e a casa é aberta para visitações agendadas, nas quais é possível degustar uma diversidade de mel e conhecer diferentes espécies de abelhas.
Wanda no cuidado com as abelhas @Bruna Nascimento/Agência Mural
Tudo começou com a paixão de Wanda pela educação e natureza. “Nasci e cresci na periferia na zona leste de São Paulo, no Itaim Paulista, e sempre tive o sonho de ser professora para ajudar a mudar a realidade do meu entorno. E consegui”, conta Wanda, que aos 21 anos se tornou professora efetiva da Prefeitura de São Paulo.
“Durante um bom tempo, fui muito feliz com a profissão de professora. Só que em 2013 eu sofri duas situações de violência na escola e desenvolvi uma síndrome do pânico. Não conseguia mais pisar na sala de aula”, relembra ela.
Após afastamento médico e de ser readaptada para outra função dentro da escola, Wanda teve depressão. Para driblar o quadro, começou uma série de cursos que foram desde a prática de crochê até cultivo de orquídeas. Foi nessa busca por novas ocupações e conhecimentos que conheceu as abelhas sem ferrão.
No Brasil, existem mais de 360 espécies de abelhas nativas.
‘A gente está deixando se extinguir uma coisa tão bonita que é nossa. Aí, eu senti muita necessidade de estudar’
Wanda Alcântara, criadora da Conexão Abelhudos
Ela participou de cursos on-line, fez parte de um projeto de Ciência Cidadã da USP (Universidade de São Paulo) monitorando o voo de abelhas e concluiu um curso de extensão universitária de meliponicultura – nome dado a criação de abelhas sem ferrão – pela Universidade Federal Catarinense.
“Muitas das vezes, assistindo a aula, colocava na televisão e a família toda assistia comigo”, conta Wanda.
Wanda escreveu o livro ‘Coisas Abelhudas que todo mundo precisa saber’ @Bruna Nascimento/Agência Mural
A partir dos estudos, vieram os convites para participar de lives e até ser professora de cursos on-line durante a pandemia de Covid-19. Com o fim do isolamento social, os convites, até então virtuais, se transformaram em aulas, palestras e exposições presenciais. Wanda também escreveu o livro “Coisas abelhudas que todo mundo precisa saber”.
“Foi muito surreal pra mim, porque eu não tinha noção da dimensão que um trabalho pela internet estava fazendo em nossa vida”, comenta. Hoje, a família também recebe convites de outras partes do estado e até de fora para falar sobre o tema. “E a depressão não teve mais espaço na minha vida porque descobri uma nova forma de ensinar”, declara.
Além de comercializar produyos, família do “Conexão Abelhudos” dá oficinas e paelstras sobre abelhas @Arquivo pessoal
Enquanto Wanda estudava sobre as abelhas, foram os filhos que iniciaram as vendas de mel. Como a renda dos pais conseguia suprir apenas o básico, os irmãos tinham a vontade de ter o próprio dinheiro. Como tinham um tio que tinha uma criação de abelhas por hobby e estava desempregado, acharam uma boa ideia comprar e revender o mel.
“Eles começaram com 10 potinhos de mel de dinheiro emprestado e venderam tudo no mesmo dia, conta Wanda. “Já pagaram o que deviam do empréstimo e reinvestiram tudo que eles tinham ganhado em mais mel. E assim foram se virando sozinhos até chegar um momento em que meu cunhado já não dava mais conta de entregar pra eles porque a produção era pouca.”
Entre os produtos vendidos está uma cerveja de fabricação própria com mel composição @Bruna Nascimento/Agência Mural
Julia em apresentação sobre diferentes tipos de mel @Arquivo pessoal
Início do trabalho em 2019 pelo desejo dos irmãos em empreender e exposição na feira Agroecologica em 2024 onde foram palestrantes @Arquivo pessoal
Colônia de abelhas Jataí @Arquivo pessoal
Cada colônia de abelhas é criada em uma caixa especial construída pelo marido de Wanda @Bruna Nascimento/Agência Mural
A ideia do Canal Youtube também partiu das crianças, e os conteúdos ainda também contam com a participação do pai nos bastidores.
A família tem planos de se mudar para o interior para restaurar uma área degradada e criar abelhas, além de levar a educação sobre as abelhas para outros produtores locais.
“A gente abriu a nossa casa pra fazer educação ambiental, mesmo sabendo que isso não é como a gente sonha ainda. Mas a gente já conseguiu ‘polinizar’ essa ideia na vizinhança”, completa ela, fazendo referência à prática das abelhas de transferir o pólen das plantas, provocando a fecundação.
Há vizinhos que passaram a criar abelhas após aprenderem em um curso com a família, outros participam de mutirões de limpeza em áreas do bairro e plantação de plantas nativas que servem de alimento para as abelhas.
Criação da família conta com mais de 10 espécies diferentes de abelhas @Bruna Nascimento/Agência Mural
Wanda explica que a meliponicultura racional e responsável garante impactos positivos para o meio ambiente, pois além de ser contra venenos e agrotóxicos, estimula a polinização, processo fundamental para reprodução das plantas, alimentos e equilíbrio ambiental.
“A abelha quando visita a flor para buscar o néctar e o pólen faz com que a parte masculina e feminina da flor se encontre. É onde a planta é fecundada e a partir dessa fecundação, se geram os frutos. Sem abelhas a gente perderia cerca de 75% da produção de alimentos que dependem desse processo”, explica a bióloga.
Segundo ela, pesquisas indicam que o brasileiro consome apenas uma colher de mel por ano. Incentivar o consumo do produto de produtores responsáveis também faz a diferença, uma vez que o consumo estimula a produção, que resulta em mais polinização.
“As pessoas só comem mel quando estão doentes, mas mel é comida. É pra estar na prateleira de guloseimas, numa torrada, no pão, no iogurte natural e até mesmo em pratos salgados.”
Fotojornalista, sonhadora, observadora e ouvinte de 'causos' profissional. Corinthiana maloqueira e sofredora (graças a Deus), boa sujeita, pois gosta de samba e tal qual Candeia na voz de Cartola, precisa se encontrar e vai por aí a procurar. Correspondente de Suzano desde 2019.
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