Arquivo pessoal
Por: Isabela Alves
Notícia
Publicado em 19.02.2024 | 8:09 | Alterado em 05.02.2024 | 15:45
A Frutilha é uma marca artesanal que produz licores e geléias com frutas típicas da região da Mata Atlântica na Ilha do Bororé, península localizada no Grajaú, no extremo-sul de São Paulo. Os produtos que são 100% naturais passaram a ser comercializados em 2019.
“Até então, a gente fazia para consumir em casa e presenteava os nossos amigos. Mas todo mundo começou a falar: Poxa vida, é tão gostoso tudo que você faz. Porque não vende?”, conta Jaqueline Ribeiro, 58, dona da iniciativa. Ela também atua na supervisão de vigilância de saúde como agente de endemias.
Junto aos filhos, começou a aproveitar as frutas plantadas no quintal para a fabricação. A filha Laura, 29, fez os rótulos das embalagens, o design da marca e o marketing nas redes sociais, enquanto o filho José Henrique, 22, auxiliava nas vendas e logística das entregas.
A tradição de produzir produtos com os alimentos do próprio quintal vem desde a avó de Jaqueline, que chegou ao território em 1948. Naquela época, não existiam tantos pontos de venda no bairro e a família acabou se virando com o que tinha.
“O que era comprado no mercado era apenas sal, açúcar e farinha de trigo. De resto, tudo era produzido no quintal”, diz Jaqueline. A avó fazia muitos biscoitos e pães, mas o que mais chamou a atenção dela foi a fabricação dos licores e doces.
Para fazer a bebida, as frutas são colhidas, higienizadas e colocadas para macerar. Ou seja, colocadas na cachaça com o vidro tampado em um ambiente fresco e escuro até chegarem no ponto.
O cambuci, que é uma das frutas mais tradicionais do extremo-sul de São Paulo, demora de 6 meses a 1 ano neste processo. Outras frutas, como maracujá, abacaxi, grumixama, acerola e pitanga, levam cerca de 20 dias de maceração. A durabilidade do licor é de 1 ano após a fabricação.
Para as geléias, são selecionadas frutas frescas ou congeladas, e elas são cozinhadas. Depois de passar pela peneira, elas voltam ao fogo, onde o açúcar é acrescentado. Após chegar ao ponto, Jaqueline vai controlando a consistência ao colocar na geladeira.
São mais de 15 sabores de licores, incluindo cajá, jabuticaba, casca de abacaxi, acerola, jerivá e hibisco. Das geléias, são os mesmos sabores com algumas variações, como por exemplo, a de cambuci com pimenta, limão com pimenta, cambuci pimenta e mel, e caipirinha.
“Se a gente não tivesse a nossa união, não conseguiria fazer nada, porque é muito trabalho. Estamos sempre fazendo algo juntos e cada um contribui com o que pode: colhendo as frutas, fazendo as polpas, a manutenção do quintal e plantando pés de frutas novas”, comenta.
Viver na Ilha do Bororé é um privilégio, mas também tem se tornado uma preocupação para a família. Desde 2019, eles vêm notando um crescimento do turismo desenfreado na região que não está sendo saudável para os animais e nem para os moradores.
“Somos um grupo de entusiastas, pois viver no Bororé é para poucos. Mesmo com as dificuldades, não desistimos do lugar. Por ser na mata, a região fornece o que a gente precisa, mas o desmatamento aqui está feroz”, alerta Jaqueline.
O território está localizado em uma APA (Área de Proteção Ambiental) e permite um certo nível de ocupação humana, para garantir a proteção e conservação dos recursos naturais. No entanto, nos últimos anos, muitas pessoas compraram ou estão alugando chácaras nos fins de semana, o que está gerando graves problemas.
Muitos animais vivem no Parque Natural Municipal Bororé e em localidades próximas que não eram habitadas antigamente. Com os anos, foram se criando corredores de alimentação, que hoje estão sendo destruídos por causa das invasões.
Assim, estão se locomovendo para outros pontos em busca da sobrevivência. A família de Jaqueline está enfrentando dificuldades de colher alguns tipos de frutos, como a grumixama por exemplo, pois muitos vão ao quintal dela para se alimentar.
As capivaras também começaram a vir da represa em grupos grandes para comer as plantas mais baixas, como as bananeiras, taiobas, inhames, chuchus e abacaxis. Para evitar a situação, a família deixou de ter a horta. “A nossa produção ao invés de crescer, está diminuindo”, lamenta.
O turismo desenfreado também tem deixado muitos moradores desconfortáveis e com medo em relação a sua segurança.
“Antigamente, a gente brincava no mato, pescava, fazia trilha e andava a cavalo. Conforme o crescimento da população, a gente tem medo de ficar com a porta aberta e nem sai para empinar pipa, porque não sabemos quem vai estar lá. É bem chocante essa mudança tão rápida”, desabafa José Henrique.
Para chegar a Ilha do Bororé é preciso atravessar uma balsa. O local chega a ter filas de até três horas nos fins de semana. “As pessoas vêm para as chácaras, fazem festas com o som muito alto, e acabam assustando os animais. Esse não é o turismo que a gente incentiva”, conclui.
Para colaborar com um turismo sustentável nas regiões do extremo-sul de São Paulo, conheça o “Vai de Roteiro”, promovido pelo Polo de Ecoturismo de São Paulo.
Para conhecer a Frutilha, acesse a página do Instagram. Os pedidos também podem ser feitos através do Whatsapp.
Graduada em jornalismo pela Universidade Anhembi Morumbi (UAM) e pós graduanda em Mídia, Informação e Cultura pelo Celacc/USP. Homenageada no 1° Prêmio Neusa Maria de Jornalismo. Correspondente do Grajaú desde 2021.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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