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Agência de Jornalismo das periferias

Lucas Silvestre/Divulgação

Por: Caê Vasconcelos

Notícia

Publicado em 12.11.2021 | 19:45 | Alterado em 27.02.2024 | 17:01

Tempo de leitura: 3 min(s)

Vita Pereira, 24, e Isma Almeida, 23, se conheceram em 2015 durante uma ocupação secundarista em uma escola de Barueri, na Grande São Paulo. Elas não imaginavam que, enquanto lutavam por um novo modelo de sociedade e educação, surgiria ali muito mais do que uma amizade, mas também uma irmandade. Parceria essa que resultou na dupla de funk Irmãs de Pau.

“A gente fazia parte de um coletivo que se reunia para debater a situação das [pessoas] LGBTs periféricas. Ocupamos por meses aquela escola pensando em um outro modelo de dinâmica escolar”, conta Vita, sobre o contexto em que conheceu a amiga.

Além de multiartistas, a dupla é apaixonada por pedagogia @Lucas Silvestre/Divulgação

Para Isma, o encontro com Vita foi ainda mais potente. Filha de pastores, ela teve uma criação muito regrada e encontrar com Vita mudou a forma de enxergar a si mesma.

“Tava curtindo a vida de ‘gayzinha’ e no terceiro ano [do ensino médio] conheci a Vita porque ela já tava causando, fazendo movimento na escola. Fiquei super: ‘nossa, acho que sou travesti também’. Ela me empurrou [para fora] do armário”, brinca Isma.

Depois de concluírem o ensino médio, as amigas estudaram em um cursinho popular oferecido pela USP (Universidade de São Paulo). Foram para a universidade cursar pedagogia, mas em cidades diferentes.

Vita foi para a Unesp (Universidade Estadual Paulista) em Araraquara, interior de São Paulo, e Isma passou na UFU (Universidade Federal de Uberlândia), em Minas Gerais. Mesmo com a distância física, a amizade da dupla só cresceu.

Além da pedagogia, elas tinham um sonho em comum: viver de arte. Foi em outubro de 2020 que decidiram que a música daria início a esse sonho e criaram a dupla Irmãs de Pau.

DOTADAS

Um ano depois, em setembro de 2021, as funkeiras lançaram o álbum de estreia, “Dotadas” — depois de um financiamento coletivo.

Com parcerias com Jup do Bairro, Alice Guél e A Travestis, o disco tem 10 faixas. Apesar de o ritmo central ser o funk, a dupla garante que quem ouvir “Dotadas” vai encontrar mais estilos musicais: dancehall, vogue, trap e uma pitada de gospel.

“‘Dotadas’ fala da época que eu podia ser a Vita somente no banheiro da minha casa, que com uma toalha eu fazia um look, fazia cabelo e conseguia imaginar. ‘Dotadas’ foi uma realização de sonhos possíveis, de atravessamentos, de ‘atravecamentos’, de experiências, de vivências e de violências”, conta Vita.

A violência, aliás, não é um ponto central no álbum porque, como explica Vita, “a gente já sabe que somos o país que mais mata travestis e pessoas trans, o país que mais mata a população negra”.

“Queríamos trazer o deboche como uma estratégia de luta e uma tecnologia travesti preta para resistir a essa violência. Ao mesmo tempo que denunciamos algumas questões, também estamos debochando do macho, do sistema, dos territórios que tanto nos menosprezaram.”

VIVER DE MÚSICA

Segundo as artistas, o trabalho com a música surge como uma forma de reelaborar a própria existência e levantar uma “epistemologia da putaria”. Vita explica: ” uma putaria que coloca nossos corpos e nossas existências em um outro lugar”, longe da marginalização.

“É a gente falando sobre o nosso pau, é a gente falando sobre o nosso corpo, sobre a produção dos nossos desejos, sobre os encontros e afetos e desafetos que a gente quer proporcionar, e denunciar também as violências e vivências.”

“A dupla surge muito nesse contexto de a gente se ver muito fragilizada por falta de emprego, falta de oportunidades e perspectivas, e juntas, frustradas, na força da farsa, nos juntamos e damos vida para esse processo que já estava vivo”, completa Vita.

MEGAZORD TRAVESTI

Isma destaca a importância de mulheres pretas, periféricas e travestis ocuparem espaço na arte, independente do gênero musical.

“É a gente falando sobre o nosso pau, é a gente falando sobre o nosso corpo” @Lucas Silvestre/Divulgação

“Duas travestis que sempre sonharam em ocupar a arte, viver da arte, realizar nossos sonhos e não se render ao sistema e aos lugares que as travestis pretas periféricas têm sido colocadas.”

E juntas as duas se completam. “Temos muitas coisas em comum, mas temos muitas coisas que não são em comum, então quando a gente junta fica completa. Ficamos uma superpotência, um megazord travesti do caralh*”, diz Isma.

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Caê Vasconcelos

Jornalista, homem trans e bissexual. Autor do "Transresistência" e repórter especializado em direitos humanos e na editora LGBT+. Correspondente de Vila Nova Cachoeirinha desde 2017.

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