Arquivo pessoal/Divulgação
Por: Isabela Alves
Notícia
Publicado em 16.10.2025 | 17:18 | Alterado em 17.10.2025 | 17:39
Um jogo de cartas que fala sobre o reconhecimento e a valorização da cultura Guarani de maneira lúdica e educativa para estudantes do ensino fundamental e ensino médio.
Essa é a proposta do “Ñandereko: O Jeito de Ser Guarani”, jogo da memória criado por Júlia Neres, 25, educomunicadora, designer, artista integrante do Corre Coletivo e moradora do Jardim São Luís, na zona sul de São Paulo.
Disponível gratuitamente na internet, a iniciativa utiliza as cartas para falar sobre cosmologia, territórios, modos de vida, racismo ambiental, justiça territorial, saúde mental, bem viver, direitos humanos e enfrentamento aos ataques sofridos pelos povos indígenas.
“Mesmo sendo um jogo da memória e tendo uma dinâmica simples, o distanciamento da língua cria a dificuldade na dinâmica”, relata a idealizadora.

Julia Neres entendeu mais sobre a sua ancestralidade indígena através da criação do jogo @Arquivo pessoal/Divulgação
O jogo consiste em pares de cartas que representam virtudes centrais da cultura Guarani (Ñandereko) e figuras de anciãs e anciãos Guarani.
“Ñandereko” é uma palavra em guarani que pode ser traduzida como “nosso modo de ser” ou “jeito de ser Guarani”. O conceito expressa a forma de como o povo Guarani vive, pensa e se relaciona com o mundo. É uma filosofia de vida, que orienta o bem viver em harmonia com a comunidade, a natureza e o espiritual.
O jogo contém 9 pares de cartas sobre Ñandereko e 6 cartas de anciãs e anciãos Guarani. Além disso, é acompanhado por uma cartilha que ajuda o educando a aprofundar as discussões.
As cores amarelo, laranja e vermelho guiam a dinâmica. Por não ser escrito em português, o jogo traz o desafio de conhecer as histórias ancestrais e aprender novas palavras na língua dos povos originários.

Reprodução das cartas do jogo Jeito de Ser Guarani @Reprodução/Instagram
Ao encontrar um par, o jogador deve consultar a cartilha para entender o significado da virtude ou aprender sobre a pessoa representada na carta.
Ela cita que ao se pensar em virtude, são trazidos à discussão filósofos, como Aristóteles ou Platão, mas há muitas reflexões a partir das histórias dos povos nativos.
‘Também é preciso aprender sobre as histórias dos povos originários e os ancestrais encantados. São nossos antepassados e fazem parte de nós’
Júlia, educomunicadora
Para criar o jogo, Júlia fez uma pesquisa pessoal sobre a memória negra e indígena nos distritos do Capão Redondo, Grajaú e Parelheiros. Nas vivências, visitou principalmente a Aldeia Krukutu, localizada na Barragem, para se inspirar na criação.
Investigar a história ancestral da sua família também foi uma grande motivação para produzir o material.
“Eu sou lida enquanto mulher negra de pele clara, mas tenho ancestralidade indígena pela família materna. Nas minhas pesquisas, descobri que a origem da nossa etnia veio do Paraná”, conta
O sonho da educomunicadora é levar o jogo para diversas salas de aulas e que mais pessoas reflitam sobre a ancestralidade indígena.
“A cultura indígena deve ser mais conhecida nas periferias. Nós estamos aqui e com muito conhecimento para partilhar”, conclui.

A educomunicadora apresenta o projeto Jeito de ser Guarani para estudantes do ensino fundamental 2 @Arquivo pessoal/Divulgação
Malu Marte, multiartista baiana e estudante de História pela Universidade Federal da Paraíba, é professora em Campina Grande (PB) e foi uma das entusiastas do uso do jogo em sala de aula.
Durante a disciplina de Ética, ao abordar os conceitos de ética e moral, ela apresentou a dinâmica aos alunos do 6º, 7º, 8º e 9º ano.
“Eles abraçaram muito bem a ideia. Os alunos aprenderam sobre os valores do povo Guarani e os conceitos de moral. Ao virar a carta, precisavam descobrir o significado daquele valor para os indígenas”, relata.

Estudantes com o jogo da memória em sala de aula @Arquivo pessoal/Divulgação
Os estudantes já tinham como referência outras aulas que tratavam de temas como racismo ambiental e racismo estrutural. Os mais novos participaram com atividades voltadas à memória, enquanto os mais velhos jogaram com o baralho completo — que, agora, incluía também personalidades dos povos Guarani.
“Foi incrível observar o desenvolvimento crítico de cada um. Além disso, foi muito divertido”.
Jornalista e cineasta da quebrada. Pós-graduanda em Mídia, Informação e Cultura e em Gestão de Projetos Culturais pelo CELACC/USP. Fundadora da Parasita Filmes, produtora independente dedicada a contar histórias do extremo sul de São Paulo.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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