Após perderem tudo nas inundações, famílias do Jardim Pantanal agora lidam com notificações de despejo e multas de até R$ 5 mil
Arquivo Pessoal
Por: Karine Ferreira
Notícia
Publicado em 24.02.2025 | 12:14 | Alterado em 24.02.2025 | 12:14
Na última semana, a GCM (Guarda Civil Metropolitana) e a Subprefeitura de São Miguel Paulista realizaram uma ação para desocupar regiões do Jardim Pantanal próximas ao leito do Rio Tietê, onde uma enchente afetou as famílias da região.
No entanto, moradores do bairro relatam que não foram informados com antecedência nem orientados sobre para onde poderiam ir ou onde buscar apoio.
Em vídeos gravados por residentes, é possível vê-los tentando proteger uma casa mobiliada enquanto o proprietário estava ausente. Nas imagens, eles pedem que a demolição seja interrompida até a chegada do dono.
Moradores reunidos na assembleia para conversar sobre o assunto
Algo semelhante aconteceu com Luana Ferreira, 18, que mora apenas com a mãe. “A vizinha pegou o papel para nós, porque não estávamos em casa. Ninguém nos orientou sobre nada. Só deram um prazo de dois dias para sair, mas não temos para onde ir”, relata.
Ela conta que vive no Jardim Pantanal há anos e que a mãe construiu a casa do zero. Sem outro lugar para morar, teme ficar desabrigada.
‘Dá medo, né? De acabar destruindo tudo que a gente tem, porque tudo que a gente tem está aqui. A gente não tem para onde ir, não tem nenhum outro lugar, não tem nada’
Luana Ferreira, moradora do Jardim Pantanal
Gislaine Franciele, 27, grávida de oito meses, enfrenta uma situação ainda mais difícil. Ela mora no Jardim Pantanal, com o marido que é motoboy, há cerca de um ano e seis meses e comprou a casa na esperança de se livrar do aluguel.
Durante a enchente, a água invadiu a residência e chegou à altura da cintura dela. “A gente comprou aqui sem saber que tudo isso poderia acontecer”, revela.
“Se o antigo dono tivesse sido sincero com a gente, a gente já tinha dado um jeito de aterrar aqui dentro, deixar mais alto para não correr risco de perder tudo. Perdemos coisas do neném, guarda-roupa, cama, colchão, cômoda, geladeira, tudo.”
Multa recebida por moradores por morarem próximo a trechos do rio @Arquivo Pessoal
Após conseguir retornar para casa na segunda-feira (17), ela recebeu uma multa já na quarta-feira (19) por permanecer no local. As multas variam de R$ 4.764 a R$ 5.717, com a alegação de que se tratam de imóveis irregulares.
“A gente já perdeu tanta coisa e ainda tem que pagar uma multa. A única orientação que nos deram foi procurar a defensoria pública ou a prefeitura para buscar nossos direitos”, explica a moradora.
Em busca de soluções, os moradores do Jardim Pantanal se reuniram com as associações locais para realizar uma assembleia geral, com o objetivo de discutir alternativas para os problemas que enfrentam.
A reunião, ocorrida na quinta-feira (19), contou com a presença de dezenas de moradores, que se uniram para denunciar o descaso na região e cobrar mais respeito e dignidade. A principal queixa foi o tratamento desrespeitoso a que os moradores foram submetidos, muitos relataram terem se sentido envergonhados com toda a situação.
A ex-enfermeira Ana Aparecida Silveira, 66, é uma das moradoras mais antigas do Jardim Pantanal, com 40 anos de residência na região. “É preciso dizer ao senhor prefeito que queremos dignidade. Eu quero ficar, mas quem quiser sair de suas casas, que saia com dignidade.”
No começo de 2025, após as chuvas fortes, o bairro ficou alagado durante semanas. Na época, o prefeito Ricardo Nunes chegou a propor a desapropriação de todo o bairro, o que levou a críticas da comunidade.
Procurada, a Prefeitura de São Paulo informou que, na quarta-feira (19), a Subprefeitura de São Miguel Paulista realizou uma ação no Jardim Helena para desocupar uma área irregular próxima ao Rio Tietê.
Durante a operação, quatro casas desocupadas foram demolidas, duas delas ainda em construção, e outras quatro habitações com moradores receberam intimações.
No entanto, a prefeitura informou que os interessados em acolhimento e atendimento social devem procurar o CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) São Miguel Paulista, sem oferecer um centro de acolhimento imediato para os moradores que perderam suas casas.
Jornalista cultural, publicitária e corinthiana. Fiel à fotografia e à música, nunca falta samba, rap ou funk no meu dia-a-dia. Correspondente do Jardim Helena desde 2023.
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