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Mulheres da zona sul marcham pelo bem-viver e preconceito contra lésbicas

Mulheres andaram do Jardim Ângela sentido ao Capão Redondo, na zona sul de São Paulo

Tatiane Lui

Por: Isabela Alves

Notícia

Publicado em 13.03.2025 | 16:27 | Alterado em 13.03.2025 | 16:45

Tempo de leitura: 4 min(s)

Cerca de 300 pessoas se reuniram no último sábado (8), Dia Internacional da Mulher, em marcha do Jardim Ângela ao Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, pelo direito ao bem-viver e contra o assassinato de mulheres lésbicas nas quebradas da capital.

A 2ª marcha “Por Todas Nós: pela vida das mulheres, contra o feminicídio e a lesbitransfobia”, promovida pelo Fórum em Defesa da Mulher, também homenageou a memória de Marli Bonfim, advogada que lutou por direitos fundamentais no território.

“Vamos botar nosso corpo na rua e caminhar. Mostramos o nosso medo e preocupação, mas também a força de que a gente pode se juntar e fazer um barulho”, afirma Luana de Oliveira, organizadora da marcha, geógrafa e educadora popular do CDHEP (Centro Direitos Humanos e Educação Popular do Campo Limpo).

Marcha de 2024 prestou apoio às mulheres lésbicas e trans @Tatiane Lui

A marcha propõe trazer para as periferias um debate sobre direitos humanos que, muitas vezes, não chega às mulheres que moram da ponte pra cá, já que a maioria das reivindicações sociais ocorrem no centro.

‘Na Paulista sempre tem a marcha, mas as nossas mulheres, as donas de casa e as senhoras, não vão. Para popularizar o debate e chamar quem é mais atravessada pela violência, era necessário fazer aqui’

Luana de Oliveira, geógrafa e educadora popular

Luana reflete que grande parte dos debates feministas discutidos no centro nem sempre dialogam com as relações complexas dentro das quebradas, pensando na intersecção entre raça e classe social.

O Jardim Ângela e o Capão Redondo estão na posição 22° e 24° no ranking dos distritos com maior número de violência contra as mulheres em São Paulo, segundo dados do último estudo do Mapa da Desigualdade de São Paulo.

“Trazer esse debate pra cá, colocando as mulheres na rua falando palavras de ordem e reivindicando melhores condições de vida, pode repercutir depois em como outras mulheres lidam com a violência”, diz.

O início da marcha

Em 2024, o estado de São Paulo registrou 250 casos de feminicídio, homicídio de mulheres cometido em razão do gênero, o maior número já registrado pela SSP (Secretaria da Segurança Pública).

A mobilização no Jardim Ângela teve como estopim o assassinato brutal de Márcia da Silva Soares, de 30 anos, em 9 de fevereiro de 2004. Partes do corpo da vítima foram encontradas em uma lixeira em frente ao Terminal Capelinha — uma das mãos, com as unhas pintadas de dourado, estava visível fora da caçamba.

Diante dessa violência brutal na porta de casa, as trabalhadoras de serviços sociais e outras mulheres da região se reuniram para criar o Fórum Em Defesa da Mulher. O mesmo grupo de mulheres já participava da Caminhada pela Vida e pela Paz, que no ano passado chegou a sua 29ª edição.

Grupo de mulheres estão promovendo formações sobre o feminismo no Jardim Ângela @Tatiane Lui

A primeira edição da marcha foi organizada em 15 dias e reuniu 400 mulheres. Durante o ano, o fórum permaneceu realizando os encontros, sempre na segunda sexta-feira do mês, com a criação de carta manifesto e carta de princípios.

O espaço também promoveu formações de educação popular sobre feminismo negro e discussões sobre o que pode ser feito em prol de avanços das políticas públicas.

“A gente nem vai falar do feminicídio, porque esse é o fim. Quando a mulher morre, não há mais o que fazer. Temos que falar das violências que atravessam o cotidiano com as mulheres que ainda se sentem culpadas, tem vergonha de falar da violência ou de chegar na UBS do bairro para contar o que está passando”, afirma Luana.

Para ela, essa é a principal razão da importância da marcha nas periferias: permitir que o debate chegue até elas e provoque reflexões sobre os seus direitos. Uma grande inspiração são os Clubes de Mães que lutaram pelos direitos das mulheres na zona sul na época da ditadura militar.

“Estamos vivas, mesmo diante de toda precariedade, falta e tudo que é negligenciado de direito, estamos em luta. Vivona e vivendo, como diz a música dos Racionais. Ainda há muito o que conquistar e, quando vamos pra rua, estamos lutando pelos nossos filhos, maridos e a comunidade como um todo”.

O direito à memória para a construção de futuro

Outro direito negligenciado dentro das periferias, segundo Luana, é o direito à memória. Por isso, este ano, as mulheres decidiram homenagear quem veio antes e abriu os caminhos das lutas populares.

A primeira homenageada foi Marli Bonfim (1953 – 2008), advogada que lutou ao lado do padre Jaime por direitos fundamentais na década de 80.Ela contribuiu com a criação da Casa Sofia, do Fórum em Defesa da Vida, Conferência Regional de Mulheres e também fez articulações na Marcha das Margaridas, que ocorre todos os anos em Brasília.

Nesta edição, a organização da marcha também fez questão de contemplar todas as formas de existir enquanto mulher, incluindo o combate ao lesbocídio e à transfobia já no título do ato.

Para ela, é necessário que os dados passem a identificar as mulheres que morreram por crime de ódio em função da orientação sexual e gênero (cis ou trans) e que se criem estratégias comunitárias para se proteger.

“Só vamos conseguir avançar com investimento, política pública, educação e a própria comunidade pode fazer a diferença nesse enfrentamento A gente se quer viva, mas só viver não basta. Queremos viver com dignidade e prosperidade”, conclui Luana.

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Isabela Alves

Graduada em jornalismo pela Universidade Anhembi Morumbi (UAM) e pós graduanda em Mídia, Informação e Cultura pelo Celacc/USP. Homenageada no 1° Prêmio Neusa Maria de Jornalismo. Correspondente do Grajaú desde 2021.

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