Com 17% das candidaturas para prefeituras, candidatas tentam quebrar histórico de falta de chefes do Executivo
Edu Guimarães
Por: Girrana Rodrigues
Notícia
Publicado em 05.11.2020 | 17:31 | Alterado em 05.11.2020 | 19:03
Rafaela Boani (PSOL) tem 21 anos e a idade mínima exigida pela legislação para concorrer à vaga de prefeita. No entanto, a pouca idade não a afastou da tentativa de quebrar um difícil histórico no ABC Paulista, na Grande São Paulo.
A jovem é uma das 13 candidatas a governar Diadema, cidade de uma região sem nenhuma uma mulher eleita prefeita desde 2000, quando Maria Inês (PT) venceu a disputa em Ribeirão Pires. No caso diademense, o comando do executivo sempre coube a homens.
“Diadema nunca teve uma prefeita mulher, então, é de uma responsabilidade muito grande saber que eu vou disputar com pessoas que já têm uma carreira política”, avalia.
Rafaela teve o primeiro contato com a política por meio do movimento estudantil, após participar de duas ocupações na Escola Estadual Diadema. Em 2015, a escola foi ocupada para pressionar o então governador, Geraldo Alckmin (PSDB), a desistir da reorganização escolar.
Já em 2016, os alunos ocuparam a escola contra a aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 241, que congelava gastos públicos — inclusive nas áreas de saúde e educação — por 20 anos. Os alunos também estavam mobilizados contra a CPI da Merenda.
Apesar de nunca ter concorrido a um cargo público, para a estreante, ser novidade durante as eleições 2020, realizadas em plena pandemia pode ser vantajoso. “Hoje, as pessoas conseguem ver em tempo real, por um celular, as lives que eu tenho feito. A gente pode usar a tecnologia para o bem”, afirma Rafaela.
Ela relembra que o celular já foi seu aliado, em outros momentos, quando podia “filmar as violências” nas ocupações escolares. “Na política não é diferente, o celular é uma coisa que está 24 horas por dia conosco. As redes sociais, tudo isso é importante”, argumenta.
APENAS 16%
Dos 59 candidatos à prefeitura nas sete cidades do Grande ABC, apenas 10 são mulheres, ou seja, elas representam 16,9% do total. A representatividade é ainda menor quando se trata de mulheres jovens, já que 70% das candidatas à prefeitura na região estão acima dos 40 anos.
No caso de Diadema, além de Rafaela, Denise Ventrici (PRTB) também está no páreo. Ela foi vereadora, entre 1997 a 2000, secretária de Meio Ambiente do prefeito Lauro Michels (PV) — com quem rompeu — , diretora do Procon e de Assistência Judiciária do município. Para Denise, ser conhecida na cidade é um diferencial.
“O fato de ter vivenciado outros governos, ter trabalhado à frente de alguns órgãos aqui na cidade, me dão notoriedade e me cacifam. É a experiência que eu acumulei”, diz.
Para Denise, embora, atualmente, se fale em empoderamento feminino e em cotas obrigatórias, “em Diadema, sempre fomos tratadas como quota para garantir maior participação masculina na política”.
A cidade com mais mulheres que se candidatam ao Executivo é Mauá. São três candidatas: Amanda Bispo (UP), Roseni Senhora das Neves (PMN) e Vanessa Damo (MDB). Em Santo André concorrem Bete Sique (PT) e Simone Cristina Souza (PCO).
O município teve uma prefeita nos últimos anos, mas temporariamente. A atual vice, Alaide Damo, governou por mais de cem dias, por causa do afastamento do titular Átila Jacomussi (PSB). Jacomussi, no entanto, conseguiu na Justiça retomar o cargo.
Em Ribeirão Pires, Marisa Reinoso (Solidariedade) é a candidata. Em São Bernardo do Campo, Maria de Lourdes (PSOL) encabeça a chapa coletiva que concorre ao pleito. A única cidade sem candidata mulher ao Executivo na região é São Caetano do Sul.
Em Rio Grande da Serra, a atual vice-prefeita, Marilza Aparecida de Oliveira (PSD), 57, disputa a corrida eleitoral para a prefeitura.
A candidata teve dois mandatos como vice-prefeita (2004 e 2008) e dois mandatos como vereadora (2012 e 2016).
“Nós, eu e minha vice, professora Helenice, temos uma história na cidade e subimos degrau por degrau para nos preparar para este momento. Nós temos contatos com diversas esferas da população. Quando a gente entra na casa das pessoas mostramos nosso trabalho, o que realizamos, é como um currículo”, garante Marilza.
Ela diz ter boa receptividade ao fato de ter uma candidatura com duas mulheres ao Executivo. “Vejo as mulheres engajadas no processo político. É preciso querer conquistar os espaços”, diz.
“A gente tem atuado em situações e profissões que eram especificamente de homens. Isso demonstra que nós, mulheres, saímos do espaço doméstico para se lançar e mostrar nossas capacidades”, diz.
A falta de mulheres também atingem a Câmara dos Vereadores, tendo em vista que na Grande São Paulo, 12 cidades não contam com nenhuma parlamentar.
Para a cientista política e professora da Universidade Federal de São Carlos, Maria do Socorro Sousa Braga, o quadro é um pouco mais complicado. Apesar da maioria dos partidos ter secretaria de Mulheres, que são importantes, a estratégia é outra.
“Os partidos mais antigos têm estratégia de normalmente apresentar candidatos mais antigos, que já são mais conhecidos. Eles são considerados ‘bons de voto’, e nessa conjuntura crítica em especial a tendência é que essa característica seja mais reforçada”, afirma Maria do Socorro Sousa Braga.
Ainda segundo ela, para acabar com a desigualdade de gênero na política será necessária a criação de outros mecanismos. Algumas regras foram criadas nos últimos anos, mas a desigualdade no repasse de recursos públicos para as eleições ainda é visto.
“O próprio sistema precisa criar mecanismo que incentivem os partidos a terem que dar conta dessas mulheres para ocupação de fato dos cargos, não só de fantasia, que fique ali só para fazer número. Eles têm que ter escolas internas, que sejam realmente escolas de formação”, sugere.
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