Os números baixos não significam que, em regiões de classe média e alta, as mulheres estejam distantes de sofrer violência
Por: Redação
Publicado em 26.08.2016 | 17:39 | Alterado em 26.08.2016 | 17:39
“Nas sextas-feiras e finais de semana são quando aparecem mais mulheres machucadas. Tem mulher que apanha porque o marido não gostou de chegar em casa e não ter jantar pronto”, comenta Maria José Conceição, 50, assistente social em um hospital público na zona leste de São Paulo. De acordo com dados compilados pela Rede Nossa São Paulo, 6.032 mulheres, de 20 a 59 anos de idade, foram internadas na cidade por causas relacionadas a possíveis agressões em 2013.
As subprefeituras da capital que ocupam as piores posições neste quesito são Parelheiros, na zona sul, Perus, na zona norte e Itaim Paulista, na zona leste.
Perus, que ocupa a segunda posição, foi a única das três a apresentar crescimento nas internações de 2012 a 2013. O índice da subprefeitura da zona norte foi de 4,5% para 26,1%, a cada 10 mil mulheres. Parelheiros passou de 45,3% para 36,2% e Itaim Paulista de 29,3% para 25,5%, a cada 10 mil.
Por outro lado, a subprefeitura de Pinheiros, na zona oeste, foi a que apresentou o menor número de registros, 0,3% em 2013. Sendo que dois de seus distritos, Jardim Paulista e Itaim Bibi, foram os únicos da capital a apresentarem valores nulos em 2013, fato que não aconteceu no ano anterior.
Entretanto, os números baixos não significam que em regiões de classe média e alta as mulheres estejam distantes de sofrer violência. A promotora de justiça e especialista em violência contra a mulher, Silvia Chakian de Toledo Santos, ressalta que a agressão contra o público feminino está presente em todas as classes sociais e destaca alguns pontos para pensar a respeito da diferença dos dados entre as regiões.
O primeiro ponto comentado pela promotora é que há um grande número de atos violentos que não levam a internação, logo, este é um recorte bem específico do problema. O segundo destaque é que a mulher de classe abastada pode usufruir de uma rede de atendimento particular, assim, há chances de as informações não entrarem em uma rede de dados.
No quesito denúncia, Silvia salienta que em todas as classes sociais as mulheres costumam demorar para denunciar o agressor. Os motivos são inúmeros, “vergonha e até dependência financeira”.
A cidade de São Paulo possui nove Delegacias de Defesa da Mulher (DDMs), Centros de Cidadania da Mulher (CCM), Centros de Referência a Mulheres em Situação de Violência (CRMS), entre outras instituições para este público.
No Plano de Metas da prefeitura há tópicos específicos para mulheres em situação de violência. É o caso das metas 40 (Instalação de 1 Casa da Mulher Brasileira) e 41 (Instalação de 1 Casa Abrigo e 1 Casa de passagem), que indicam respectivamente, 50% e 41,3% de conclusão. Todavia, a atualização do andamento das metas aconteceu há mais de seis meses.
O 32xSP contatou a Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres para saber a situação atual dos projetos, mas não teve nenhuma resposta até o fechamento da matéria.
Além da quantidade de locais que prestam serviços a vítimas de agressões, outro fator importante é a qualidade do atendimento. Um grupo de militantes feministas visitou diversas instituições que atendem mulheres agredidas para observar o ambiente.
A atividade faz parte do curso de educação popular para compreensão dos direitos da mulher em diversas áreas, a formação para “Promotoras Legais Populares”, da União das Mulheres de São Paulo.
Entre as discussões instigadas pelo trabalho de campo, foram destacadas a quantidade insuficiente de funcionários para atender nos estabelecimentos e a fraqueza na divulgação dos serviços para que as vítimas de violência saibam onde buscar ajuda. “Os serviços existem, mas falta divulgação e a demanda é muito grande”, “O serviço existe, mas é precário. Faltam funcionários e apoio para os bons que lá trabalham”, foram algumas falas das apresentações.
Outros fatores pontuados foram o atendimento rústico em algumas Delegacias de Defesa da Mulher e o horário de funcionamento delas que não abrange o período noturno e fins de semana. Além disso, foi debatido que nos atendimentos policiais não são apenas os funcionários do sexo masculino que discriminam as vítimas. “Falta formação humanizada e compreensão por parte das funcionárias mulheres também”, diz a assistente social Maria José Conceição.
Já Rute Alonso, 35, uma das coordenadoras do curso “Promotoras Legais Populares”, chama a atenção para o estímulo do empoderamento feminino. Afinal, ele contribui para o desenvolvimento do pensamento crítico para que haja a exigência dos próprios direitos. “Se eu não recebo um bom atendimento em algum lugar, tenho que reclamar e saber onde levar as reclamações e exigências”, explica.
A promotora Silvia Chakian de Toledo Santos acredita que há um caminho longo para minimizar a violência contra a mulher e que a mudança não depende apenas de uma esfera. É importante um conjunto de estratégias que atuam em parceria e isso vai desde a educação até a capacitação para um bom atendimento nas organizações que recebem as vítimas. “Um atendimento ruim inibe a denúncia assim como um bom pode atrair”.
*Foto: Ronaldo Silva/AGECOM
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