Por: Isabela Alves | Aline Almeida
Notícia
Publicado em 20.01.2023 | 8:43 | Alterado em 26.01.2023 | 17:47
Prometido para 2024, o primeiro transporte público hidroviário da cidade de São Paulo prevê atender até 200 mil passageiros por dia no Grajaú, na zona sul. Além dos passageiros que vão circular sobre as águas da represa Billings, o chamado ‘Projeto Aquático’ é aguardado com ansiedade por um grupo de moradores que depende do trabalho na represa: os pescadores.
No distrito, há cerca de 100 pessoas que atuam com a pesca e tem expectativa de como esse novo transporte pode mudar a rotina da região.
A implantação foi anunciada pela prefeitura no ano passado e prevê ligar o distrito do Grajaú ao de Pedreira, também na zona sul, num trajeto de 10 minutos por meio de embarcações.
Atualmente a única via de locomoção é a Avenida Dona Belmira Marin, que contorna toda a represa Billings – um dos maiores e mais importantes reservatórios de água da capital paulista.
“Vai melhorar a vida de quem mora longe e gasta quatro horas da vida dentro do transporte. O turismo também vai enriquecer o bairro”, avalia o pescador Cosmo de Assis Aragão, 67.
Cosmo e o filho Adriano dos Santos, 45, exercem a profissão desde a década de 1990. O peixe mais encontrado e vendido na região é a tilápia, que geralmente custa R$ 15 o quilo. Traíra, carpa, lambari, bagre, cascudo, manjubinha e mussum são outros peixes que podem ser encontrados na represa.
“Aqui tem toda a qualidade de peixe. Só que tem que ter a rede apropriada para a pesca”, conta Adriano, que também atua como vendedor nas horas vagas.
Com os avanços do transporte, os trabalhadores também expressam preocupação em relação à atividade pesqueira, já que a Prefeitura ainda não deu orientações sobre como será o processo da instalação por parte da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente, da Marinha e do Corpo de Bombeiros.
“Pode ser que prejudique onde o pescador armava a rede. Talvez ele não consiga mais, porque a embarcação vai passar por cima. Aqueles que armam na superfície, além de perder a rede, podem até comprometer a própria embarcação”, observa Adriano.
A preservação da represa é outra preocupação. Cosmo tem acompanhado a situação do local nas últimas décadas. “A represa antigamente era mais poluída. Tinha empresas industriais em Santo Amaro [na zona sul de São Paulo] que jogavam óleo na água. Hoje, ela sofre com o esgoto”, afirma.Apesar disso, ele não vê riscos de piora com o novo sistema de transporte.
Todos os anos, o aposentado presencia como a represa encontra novos mecanismos para sobreviver. Neste ano, a Billings reagiu com a aguapé, planta aquática que fica nas bordas da represa. Elas são capazes de remover poluentes pesados da água. No entanto, a poluição em excesso aumenta a presença dessa planta, o que já dificultou o trajeto das balsas na região da Ilha do Bororé, também no Grajaú.
Uma pesquisa realizada pela USCS (Universidade de São Caetano do Sul), em parceria com a USP (Universidade de São Paulo), revelou que a água da Billings apresentava uma extensa mancha verde com pontos azulados.
Tais manchas apresentavam toxinas letais à saúde humana e dos animais que consomem a água. Em novembro de 2019, milhares de peixes apareceram mortos na região.
Outro detalhe importante, é que todas as vezes que chove, o lixo que está no fundo da represa sobe para a superfície e fica enroscado nas redes. “A gente sabe o quanto essa represa luta para sobreviver”, relembra Cosmo.
Ele conta que em 1993, a poluição levou a área a ficar sem peixes no trecho onde pesca atualmente, por conta do despejo de resíduos. “A água não balançava e ficou como se fosse um mingau. Todos os pescadores iam para a Estrada Velha de Santos, na Anchieta, onde tinha oxigênio para os peixes”, relata.
O estímulo ao turismo também é visto com bons olhos pelos pescadores que neste período buscam uma renda extra. Entre 1º de novembro e março, ocorre a “piracema”, período em que os pescadores ficam proibidos de pescar para não interromper o ciclo de reprodução dos peixes.
Com isso, uma das alternativas é realizar passeios. Jocelia Almeida Pitanga, 47, constrói redes, trabalha como feirante e também já chegou a transportar as pessoas pela represa.
“A gente cobrava um valor simbólico para pagar a gasolina e as pessoas gostaram”, conta. Para as viagens, era permitida a entrada de cinco pessoas mais o tripulante. As viagens iam do Jardim Tangará até o Jardim Graúna, na Cidade Dutra, ou ao distrito da Pedreira.
O tempo de viagem durava cerca de 3 a 10 minutos, de acordo com o vento. “Não sabemos se o transporte será de embarcação ou balsa, mas ele vai ajudar bastante. As pessoas perdem muito tempo da vida no trânsito”, fala a pescadora.
Graduada em jornalismo pela Universidade Anhembi Morumbi (UAM) e pós graduanda em Mídia, Informação e Cultura pelo Celacc/USP. Homenageada no 1° Prêmio Neusa Maria de Jornalismo. Correspondente do Grajaú desde 2021.
Formada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Ama livros, música e séries. Libriana apaixonada por pets. Correspondente do Grajaú desde 2022.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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