Na contramão de outros líderes comunitários, nas duas maiores favelas de São Paulo, lideranças dizem que não apoiam nenhum nome nestas eleições
Léu Britto/Agência Mural
Por: Lucas Veloso
Notícia
Publicado em 10.11.2020 | 18:43 | Alterado em 11.11.2020 | 0:24
Com a pandemia de Covid-19, uma das orientações médicas é o distanciamento social. Em Heliópolis e Paraisópolis, as duas maiores favelas de São Paulo, algumas lideranças comunitárias têm preferido adotar o distanciamento também com relação aos candidatos.
Ao contrário de outras periferias, em que líderes se tornaram ‘puxadores de votos’ em prol de alguns nomes e partidos, líderes das maiores comunidades da capital não estão mobilizadas por nenhum candidato, apesar de terem sido procurados por diversas legendas.
Em Paraisópolis, Gilson Rodrigues, 35, líder comunitário e coordenador nacional do G10 Favelas, diz que a comunidade está focada no trabalho de controle da Covid-19. “Infelizmente, o prefeito nem os candidatos nos ajudaram neste período [da pandemia]. O trabalho está quase parando devido à diminuição de pessoas doando. Então, a princípio, não iremos apoiar ninguém”.
Os números confirmam a fala de Gilson. Em junho, um estudo do Instituto Pólis mostrou que, em alguns bairros da cidade, o controle da Covid-19 estava sendo mais efetivo em comparação com a média municipal.
Segundo os números, em 18 de maio de 2020, a taxa de mortalidade na favela por Covid-19 era de 21,7 pessoas por 100 mil habitantes. O índice estava abaixo da média municipal (56,2) e de regiões como Pari (127), Brás (105,9), Brasilândia (78) e Sapopemba (72).
Na época, um dos motivos indicados para os bons resultados foi uma ação pensada pelos próprios moradores.
“A associação de moradores de Paraisópolis desenvolveu estratégias para suprir a falta de políticas públicas para a comunidade. Primeiramente, foi criado o sistema de presidentes de rua, em que voluntários ficam responsáveis por monitorar famílias para possíveis sintomas do Covid-19. Foram cerca de 420 presidentes – cuidando de cerca de 50 casas cada”, informou o instituto no levantamento.
Meses depois, os dados colhidos pelo Instituto Polis e pelo Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade (LabCidade), fornecidos por meio da Lei de Acesso a Informação, mostraram que, em agosto, o índice passou para 54 óbitos por Covid-19 a cada 100 mil habitantes, um aumento de 237,5% na comparação com os primeiros meses da pandemia.
Além disso, a região vive com demandas antigas, como a demora para conseguir uma vaga em creche que pode chegar a nove meses, como mostra o 32xSP.
Gilson diz que três candidaturas chegaram a procurar a associação em busca de mobilização na campanha, mas que nenhuma proposta vingou. Tradicionalmente, os candidatos costumavam ser recebidos na rádio comunitária Nova Paraisópolis para serem sabatinados pelos moradores, mas devido à pandemia, não houve programação.
No plano municipal, o líder reclama da prefeitura sob a justificativa de que não houve interesse em apoiar a comunidade, sobretudo na pandemia. “O prefeito não retornou as obras de urbanização, não criou ações de apoio ao combate da doença e não recebeu os presidentes de rua [uma das principais ações locais para evitar o contágio na favela] quando fizemos uma manifestação pacífica para pedir apoio para a população”.
Questionada sobre as críticas apontadas no texto, a Prefeitura de São Paulo não respondeu à reportagem.
HELIÓPOLIS
Presidenta da Unas (Associação dos Moradores de Heliópolis), Antônia Cleide Alves, 56, relata dificuldade para ser atendida na UBS da favela. “Demora de três a quatro meses para ser atendido, fazer uma consulta. Precisa ter tempo se for para depender dos serviços”.
Essa é uma das prioridades que ela indica para o próximo prefeito na região. Sem mobilizar apoio a nenhum candidato, Antônia diz que vê a favela como uma cidade, pela quantidade de pessoas. Afirma que o espaço geográfico é pequeno para o número de moradores.
Segundo dados do Mapa da Desigualdade, da Rede Nossa São Paulo, os moradores da subprefeitura do Ipiranga sofrem com a falta de vagas de trabalho. Na cidade, a média é de 4,8 postos de trabalho formal por dez habitantes, mas no distrito de Sacomã, onde fica Heliópolis, o índice é de 1,54. Entre outras demandas, a falta da coleta seletiva e de médicos são outras coisas apontadas por moradores.
Para Antônia, o prefeito deveria articular um plano municipal para atender as pessoas da comunidade. Entre as urgências está o lixo, que conta com menos coleta seletiva que o ideal, além da falta de espaço cultural para os jovens promoverem festa e a urbanização da favela.
Outras lideranças de regiões de São Paulo também questionam a atual gestão e cobram que haja mais diálogo com o futuro prefeito.
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