Por: Amanda Oliveira
Notícia
Publicado em 03.04.2024 | 16:06 | Alterado em 03.04.2024 | 19:28
Muito barro ou muito pó. Não há escolha para moradores de pelo menos sete bairros de Guarulhos que há anos moram em ruas de terra ou próximo a elas. Sem vias pavimentadas, não é possível se deslocar com segurança ao ponto de ônibus, pedir carros por aplicativo ou mesmo chegar até a porta de casa em veículo particular.
Moradores ouvidos pela Agência Mural reclamam da lama excessiva, córregos poluídos e abertura de grandes buracos nas ruas de terra na época de chuvas. A prefeitura de Guarulhos não possui um levantamento oficial do número de vias sem pavimentação, nem dos impactos delas para o dia a dia dos munícipes.
“Um motorista do Uber se recusou a vir até minha casa. Sou uma senhora de idade e com problemas para andar. Ele disse que essa rua [de terra] estragaria o carro dele e me deixou em outra rua com asfalto”, conta dona Dejanira, 76, mais conhecida como dona Deja, que há 30 anos mora na Rua Hans Heitel Hohl, não asfaltada, no bairro do Cabuçu.
Moradores colocam pedregulhos em meio ao barro para tentar melhorar locomoção na rua Hans Heitel Hohl @Amanda Oliveira
Parte da via é uma ladeira íngreme e os moradores que vivem nas casas acima dela não conseguem subir com carros em dias chuvosos. É comum que veículos de aplicativo recusem corridas. No caso de dona Deja, ela teve que descer do carro há pelo menos 30 minutos do ponto de desembarque e precisou contar com a ajuda de vizinhos para chegar em casa.
Para Milton Alves, 63, também morador da Rua Hans Heitel Hohl, a via foi esquecida pelo poder público. No entanto, com a proximidade do período eleitoral, ele já espera que candidatos passem por lá prometendo pavimentação, como afirma ter ocorrido nas últimas eleições municipais.
Ao longo do último mandato, o vereador Edmilson Souza (PSOL) foi até a rua Rua Hans Heitel Hohl conferir a situação. A assessoria de imprensa do parlamentar informou que ele solicitou e conseguiu aprovar o projeto de pavimentação da via junto à prefeitura. Contudo, para que ele seja executado, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) precisa enterrar a tubulação de água a uma profundidade maior do que a atual. Até a finalização desta reportagem o órgão não se posicionou sobre a obra.
Moradores vivem sem acesso a pavimentação na rua Hans Heitel Hohl há décadas @Amanda Oliveira
Em nota, a prefeitura de Guarulhos informou que “há uma empresa contratada para realizar toda atualização cadastral em 100% do município” sobre ruas de terra, com levantamento aerofotogramétrico. A conclusão está prevista para o primeiro trimestre de 2024. Só aí a prefeitura terá um quadro real sobre todas as vias sem asfalto e as situações dos imóveis nelas localizados.
O último levantamento sobre o problema, realizado no início da década de 2010, “não foi conclusivo”, de acordo com a prefeitura. Desde então, já ocuparam o Executivo municipal os prefeitos Sebastião Almeida (PT) e Guti (PSD), atual prefeito em seu segundo mandato.
Na estrada do Saboó, no bairro guarulhense do Marmelo, moradores também se queixam dos transtornos causados pelas vias sem pavimentação, incluindo dificuldades de carpir, limpar e tampar buracos de ruas sem asfalto.
A decoradora de eventos, Sarah Batista, que mora na estrada do Soboó desde 1994, já reivindicou a pavimentação da via, mas foi informada que, pela rua fazer divisa com Mairiporã, parte da obra deveria ser feita pela prefeitura do município e parte por Guarulhos. Não há previsão de iníciol.
As mesmas dificuldades – e falta de perspectivas – são vividas por quem utiliza a também não pavimentada Estrada Conceição do Bananal, no Jardim Primavera. Alguns dos moradores mais antigos, que vivem no local há pelo menos 20 anos, relatam que têm cada vez mais dificuldade de se locomover entre o bairro e o centro de Guarulhos com segurança.
“Os desafios por aqui são vários, como o correio não chega e o uber cancela a corrida principalmente em dias de chuva devido e nos períodos de muito calor, por causa da poeira”, conta a professora de inglês Mayara Nofoente. “Quando saímos a pé em dias muito chuvosos, temos que levar outro sapato para trocar ou um pano para limpar o sapato. Já tivemos até problemas com a coleta de lixo”.
A resposta parece simples: de acordo com o artigo 186 do Código Civil, a responsabilidade pela colocação e manutenção do asfalto é da prefeitura do município. Em Guarulhos, porém, os projetos de pavimentação têm levado anos para sair do papel.
O município da Grande São Paulo conta 35 vereadores, todos procurados pela Agência Mural entre janeiro e fevereiro de 2024, para prestar contas sobre projetos de pavimentação de vias. Os contatos foram feitos pelo email oficial disponibilizado no site da Câmara. A única resposta foi do vereador Edmilson Souza (PSOL), via assessoria de imprensa.
“Foram protocolados diversos ofícios solicitando a pavimentação de ruas, porém o governo não atendeu os pedidos […] Solicitamos, entre outras, a pavimentação das ruas Maromomis e Guaramomis,no Jardim Paraíso. As ruas Nelson Ferraz e ruas paralelas no Conjunto Marcos Freire. No bairro do Anita Garibaldi os pedidos foram para a Rua Eldorado dos Carajás e ruas de acesso e paralelas”.
Rua Marau sem asfalto no Jardim Conceição do Bananal @Amanda Oliveira
A reportagem questionou sobre a pavimentação da Rua Hans Heitel Hohl e foi informada que o pedido de pavimentação também foi solicitado, assim como o de todas as vias do bairro das Malvinas.
A prefeitura de Guarulhos informou que mantém um programa de mutirão chamado Mãos à Obras, pelo qual fornece materiais, equipamentos e assessoria técnica para que os munícipes façam o calçamento de vias. O órgão informou que, de 2020 a 2023, 136 vias foram pavimentadas por meio do programa, totalizando 20.492 metros lineares e 109.020 m2.
Em março de 2024, a prefeitura iniciou uma obra de pavimentação, com blocos de concreto intertravados, da viela Leste B, no Jardim Ponte Alta, por meio do sistema Mãos à Obra.
Em abril de 2023, a Prefeitura de Guarulhos firmou um acordo com o Ministério Público do Estado (MP-SP) e a Defensoria Pública do Estado de São Paulo para realizar obras de segurança ou realocar ao menos 39 mil pessoas que vivem em áreas de risco. Ao todo são 9.446 moradias.
As ações de compensação incluem a pavimentação de vias, além da canalização de esgoto e água, a regularização do fornecimento de energia elétrica e implementação de um sistema de captação e drenagem de águas pluviais.
Ao longo de 2023, pelo menos 250 famílias de Guarulhos receberam o título de propriedade de seus imóveis nos bairros Jardim São Domingos, Jardim Ponte Alta, Jardim Maria Clara e Parque Santo Agostinho. Foram entregues também 1.277 títulos de regularização fundiária a moradores do bairro Anita Garibaldi, segundo o jornal Folha Metropolitana.
Outros bairros, porém, ainda aguardam pelas ações e pelos projetos de pavimentação de vias.
Jornalista, pós-graduada em comunicação e marketing e autora do livro reportagem: Liberdade Roubada- O drama de pessoas que foram presas injustamente. Causas sociais, direito de igualdade/equidade a motivaram a fazer jornalismo.
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