Pelo menos oito unidades de saúde da capital paulista estão sem testes rápidos para a Covid-19. É o que aponta um levantamento feito pela Agência Mural em UPAs (Unidade de Pronto Atendimento) e AMAs (Assistência Médica Ambulatorial) das quatro regiões da cidade de São Paulo entre terça (18) e sexta-feira (21).
Com resultado em até 15 minutos, os testes rápidos de antígeno foram distribuídos nas unidades de saúde municipais no dia 5 de janeiro. A ideia era acelerar os diagnósticos da doença e interromper a cadeia de transmissão em meio ao aumento de casos de coronavírus na cidade.
Duas semanas depois de receberem os exames, no entanto, AMAs e UPAs já estão com os estoques vazios. Na zona sul, a subprefeitura do Campo Limpo tem dois endereços sem o teste, a AMA Pirajussara e a UPA Campo Limpo. Nas duas unidades apenas o teste RT-PCR, que leva de três a cinco dias para ficar pronto, está disponível.
A manicure Noelia Rosa de Araújo, 49, mora na Favela do Pullmann, na Vila Andrade, e procurou um dos postos depois que a irmã foi infectada. Sem conseguir fazer o teste rápido pelo atendimento gratuito, acabou gastando R$100 numa drogaria. “Acabei tendo que ir na farmácia e pagar [por um teste]. Como é que eu ia atender as clientes sem saber se eu tava com a Covid ou não?”
Noelia, a irmã e outros três parentes testaram positivo e estão com Covid. Todos buscaram unidades de saúde na região e não conseguiram ser atendidos. “Minha irmã foi em dois postos e eles não fizeram teste”, comenta.
Ainda na zona sul, a UPA Pedreira, em Interlagos, também está sem testes rápidos. Por lá, o exame RT-PCR leva cinco dias para ficar pronto, segundo uma funcionária do local.
Na zona leste, a AMA Guaianases é outra com estoques vazios. Postos da região que ainda contam com algumas unidades do exame, como a UPA 26 de Agosto, em Itaquera, e a AMA Jardim das Laranjeiras, no bairro de mesmo nome, fizeram restrições para a testagem de pacientes, seguindo uma orientação da prefeitura.
Por causa da escassez de material, desde a semana passada, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) tem indicado que apenas pacientes do grupo de risco, como gestantes e não-vacinados, ou aqueles com dois ou mais sintomas sejam testados. Apesar disso, a reportagem ouviu relatos de sintomáticos que não foram examinados.
É o caso da analista Larissa Ribeiro, 22. Com dor de garganta e tosse, ela procurou a AMA Jardim das Laranjeiras depois que um colega de trabalho foi infectado. “Simplesmente falaram que não tinha como fazer porque eu aparentemente estava bem. Me orientaram a ficar em casa até o dia 20 (quinta-feira).”
A UPA Jaçanã e a AMA/UBS Wamberto Dias da Costa, na zona norte, e a UPA Pirituba e AMA City Jaraguá, na zona oeste, completam a lista de unidades sem exames de antígeno.
Unidades sem testes na capital
Região | Bairro | Unidade |
Zona sul | Interlagos | UPA Pedreira |
Zona sul | Pirajussara | AMA Pirajussara |
Zona sul | Campo Limpo | UPA Hosp. Campo Limpo |
Zona norte | Jaçanã | UPA Jaçanã |
Zona norte | Tremembé | AMA/UBS Wamberto Dias da Costa |
Zona oeste | Pirituba | UPA Pirituba |
Zona oeste | Jaraguá | AMA City Jaraguá |
Zona leste | Guaianases | AMA Guaianases |
Em entrevista à Agência Mural na última sexta-feira (21), o secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido, confirmou o problema e disse que os estoques de toda a rede estão praticamente zerados. “Temos muito pouco [teste], quase nada.”
Segundo ele, a prefeitura negocia a compra de um lote com 1 milhão de testes rápidos para abastecer a rede a partir de quarta-feira (26). Enquanto isso, os postos continuarão oferecendo testes RT-PCR para a população.
No dia 17 de janeiro, Aparecido já havia anunciado que a cidade só tinha testes para 15 dias, mas o desabastecimento começou antes deste prazo.
Para Wallace Casaca, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e coordenador da plataforma Infotracker, que mede a velocidade de transmissão da doença em São Paulo, a falta de exames prejudica o controle da pandemia.
“Se a gente quiser ter algum sucesso em conter o avanço tão explosivo dessa variante, nós vamos precisar de mais insumos, de autotestes e da ampliação da capacidade de processamento dos nossos laboratórios.”
Wallace Casaca
A cidade de São Paulo vive um crescimento acelerado de casos desde dezembro do ano passado. Atualmente, a taxa de transmissão do coronavírus (chamada de Rt) está em 1,71 na capital. Isso significa que cada 100 pessoas infectadas estão transmitindo a doença para outros 171 paulistanos.
Especialistas consideram que a pandemia está sob controle quando o índice que mede a velocidade de transmissão fica abaixo de 1.
Situação em outras cidades
Na região metropolitana, as cidades de Poá, Guarulhos, Suzano e Mogi das Cruzes também enfrentam escassez do exame em alguns postos.
Em Guarulhos, as UBSs São Rafael e Belvedere, localizadas nos bairros Parque São Rafael e Parque Primavera, oferecem somente testes RT-PCR, que levam de sete a dez dias úteis para ficarem prontos.
Uma moradora que preferiu não se identificar lamentou a situação. “Não temos teste rápido, não temos médico, e nas farmácias os preços são absurdos. Me sinto impotente por não saber se estou ou não com Covid, como eu vou procurar ajuda assim?”. A Prefeitura de Guarulhos não respondeu o pedido de nota da reportagem.
Em Poá, funcionários das unidades de saúde afirmam que o problema da falta de testes rápidos acontece desde o ano passado. Nas unidades de ESF’s (Estratégias de Saúde da Família) do Jardim São José, Vila Varela, Jardim Julieta e Jardim Emília, não há mais estoques do exame e a população é testada com o RT-PCR.
Os pacientes são submetidos ao RT-PCR depois de passarem por uma avaliação médica e o resultado é enviado por e-mail em cinco dias. A única exceção é no ESF Vila Varela, onde a indicação de testagem é imediata para pacientes que cheguem ao local com febre. A Agência Mural também contatou a unidade do bairro Cidade Kemel, mas não obteve retorno.
Em nota, a Prefeitura de Poá diz que a partir de segunda-feira (24), os testes serão realizados em todos os postos de Saúde (UBS’s e ESF’s) e que qualquer morador pode ser atendido, sem prioridade para grupos específicos.
No Alto Tietê, a escassez de testes leva moradores a procurarem o exame em mais de uma cidade. Lisbela Regina Diogo Rodrigues, 67, por exemplo, foi até a UPA Rodeio, no município de Mogi das Cruzes, quando sentiu tosse, dor de garganta e febre.
Como não realizaram nenhum exame, ela procurou a Santa Casa de Suzano, cidade vizinha de Mogi, mas também ficou sem teste. “A médica não pediu nenhum exame, receitou remédio para gripe e só. Isso mesmo depois de eu ter falado que tive contato com quem teve Covid”, relata.
Unidades sem testes na Grande São Paulo
Cidade | Bairro | Unidade |
Guarulhos | Parque São Rafael | UBS São Rafael |
Guarulhos | Parque Primavera | UBS Belvedere |
Poá | Jardim São José | ESF Jardim São José |
Poá | Jardim Julieta | ESF Jardim Julieta |
Poá | Jardim Emilia | ESF Jardim Emília |
Poá | Vila Varela | ESF Vila Varela |
Suzano | Vila Figueira | Santa Casa de Suzano |
Mogi das Cruzes | Rodeio | UPA Rodeio |
Em nota, a Secretaria de Saúde de Suzano informou que os exames RT-PCR são oferecidos em todos os postos da cidade. O resultado é obtido em até dez dias. Segundo o órgão, os testes rápidos são realizados a partir de solicitação médica e o resultado sai na hora.
A Prefeitura de Mogi das Cruzes também respondeu que o teste RT-PCR está disponível na rede municipal, somente para casos indicados pelo médico assistente. A coleta é feita por meio do swab nasal (cotonetes colocados no nariz) e o resultado sai em até 15 minutos. “Não há testagem indiscriminada e/ou em demanda livre neste momento”, diz a nota.