Ariane Costa Gomes/Agência Mural
Por: Ariane Costa Gomes
Notícia
Publicado em 18.02.2022 | 15:36 | Alterado em 20.02.2022 | 21:15
A Toca da Coruja, sede do Vila Izabel, não deve muito para times profissionais: possui campo de futebol, bar, lanchonete, restaurante, loja de produtos oficiais, camarote, bloco de carnaval e estacionamento gratuito. É ali, no bairro Cidade das Flores, que a equipe se tornou uma das mais fortes do futebol amador de São Paulo.
Atual campeão da Copa Martins Neto, a Associação Atlética Vila Izabel é um dos símbolos de Osasco, cidade que completa 60 anos de emancipação neste sábado (19).
Não é difícil encontrar pessoas usando alguma peça do time azul e branco pelas ruas da cidade. O campo já foi cenário de clipes como “País do Futebol” de MC Guimê e Emicida e “Aonde Nós Chegou” de Menor MR e MC Dede, além de ações sociais promovidas pelo youtuber Cocielo, também nascido na cidade.
Fundado em 1948, a equipe conta com mais de 30 mil seguidores nas redes sociais. Além disso, a agremiação possui quatro torcidas organizadas: as subsedes Pestana, Casinhas (comunidade no Padroeira), KM 18 e na Rio San, comunidade também no bairro do KM 18.
“[2021] foi um ano gratificante para nós por causa dos títulos. Sofremos muito durante essa pandemia de Covid-19, perdemos pessoas queridas”
Julio Cezar Souza, 49, presidente do Vila Izabel
O título da Martins Neto é um dos principais do futebol amador pois reúne os campeões de cada uma das regiões (leste, sul, norte e oeste) da capital e Grande São Paulo. Na decisão, a equipe venceu o Pau no Gato por 3 a 1 em dezembro. Foi a segunda vez que o time se sagrou campeão – a primeira conquista foi em 2015.
Animal símbolo da sabedoria, a coruja é o mascote do Vila Izabel
Bateria é um dos pontos fortes do clube
Missa é um dos que está há décadas na equipe e atua na bateria @Ariane Costa Gomes/Agência Mural
Bloco da Coruja, onde aconteciam atividades do carnaval @Ariane Costa Gomes/Agência Mural
O resultado encerrou a temporada do time que ganhou ao longo de 2021 a Copa Martins Neto Zona Oeste, Sessentão de Osasco e a Copa Petrolhão Subsede Pestana.
Uma parte da formação do time está na base. O Vila Izabel tem escolinhas de futebol com alunos que vão de 5 a 20 anos. “Por meio da escolinha de futebol desenvolvemos um trabalho junto com uma assistente social que acompanha as crianças casa a casa”, diz Julio Cezar.
Os participantes são de bairros vizinhos como Pestana, Padroeira, Jardim Roberto, Veloso, Quitaúna e outros.
“Quando tiramos o garoto da rua e fica uma hora e meia no campo proporcionamos preparo físico. O nosso lema é prata da casa, vale ouro, sempre vai valer ouro. Se trabalhar direitinho vai virar algo na vida com certeza”, diz Meira, 63, um dos quatro professores da escolinha de futebol. “Se não for jogador, vira engenheiro, professor, mecânico, outros e assim vai indo”, diz.
Essa formação desde cedo tem feito com que muitos sigam no clube por décadas. Atual diretor comercial, Renatinho Borges, 33, passou por todas as áreas. Nascido e criado na várzea, acompanhava o time do Fumaça, também de Osasco, junto com o pai. Quando ele morreu, o filho, que tinha 15 anos, se afastou dos campos e foi trabalhar.
Retornou ao Vila Izabel como atleta e nos anos de 2013 e 2014 participou das conquistas da terceira e segunda divisão de Osasco. Também teve passagem como técnico.
Hoje cuida de uma área importante do Vila, as vendas dos produtos. A equipe conta com uma loja de produtos oficiais instalada em sua sede e uma loja no Instagram, em que são vendidos artigos como agasalhos, regatas, camisetas e bonés.
“Toda semana eu vou aos Correios enviar produtos até para fora do Estado de São Paulo. Somos muito queridos no Nordeste”, conta Renatinho.
Além disso, o clube promove outras competições, como a Copa do Busão, que está na quinta edição, e premia o vencedor com um ônibus adesivado personalizado e o segundo lugar recebe o prêmio de R$ 10 mil. Disputam equipes da várzea de Osasco e também de cidades vizinhas como Carapicuíba, Cajamar, Itapevi, São Paulo entre outras.
Além do time principal, o Vila Izabel possui equipes de diferentes categorias: sessentão (jogadores com idade a partir de 60 anos), master (a partir de 50 anos), veteranos mais de 40, veteranos mais de 35, time B com jogadores de até 25. Em 2021, foram montados dois times de futebol feminino com atletas de 15 a 23 anos.
“É como uma família. Acompanho todos os jogos. Levo meus filhos, venho todo sábado e domingo”, diz Walmir Moura Manoel, 49, que trabalha com manutenção geral e já jogou pelo Vila Izabel.
Morador do bairro Km 18, quando mais jovem era atleta de outra equipe de várzea quando recebeu o convite para jogar no Vila. Ficou menos de um ano na equipe após quebrar o tornozelo esquerdo durante uma partida. A recuperação levou um ano e meio.
Em julho, ele completará 50 anos e já se prepara para voltar ao campo como veterano. “Já comecei a correr, estou andando bem de bicicleta e caminhando bastante. Não pode parar né?”, conta.
A coruja, animal considerado símbolo da sabedoria, se tornou o mascote por conta dos vários ninhos do pássaro na área verde em volta do clube. Daí o nome da sede da equipe.
O local também é palco de muito samba e atividades voltadas à comunidade. Na Toca da Coruja são oferecidas aulas gratuitas de zumba, pilates, capoeira, funcional e dança do ventre. O trabalho é resultado da parceria com a prefeitura que, além de manter os professores, fez a concessão do espaço.
Um dos planos da gestão do clube é implantar aulas de informática e de reforço escolar. “Quem administra o Vila Izabel é o próprio Vila Izabel. A prefeitura cedeu o espaço, mas quem faz a manutenção somos nós”, explica Julio Cezar.
Mas uma marca consolidada tem sido o samba. Wellington Lima, 49, mais conhecido como Mestre Tetinha, é o presidente da escola de samba Bloco da Coruja. Começou no time como jogador aos 18 anos, posição que ficou durante cinco anos e já teve passagens pela diretoria e presidência.
“Faz 25 anos que existe a bateria e a escola de samba existe há dez anos. Antigamente era só uma brincadeira na beira do campo e depois tornou-se algo mais sério”, conta o morador do bairro Quitaúna que já tocou tamborim nas escolas de samba da Rosas de Ouro e Unidos de Vila Maria.
A bateria “Tanque de Guerra” conta com 70 componentes. “Tem esse nome porque a bateria do Vila Izabel não para. O juiz apitou, só paramos quando o jogo termina”, afirma.
Missa, 47, acompanha o Vila Izabel desde criança e, ao lado do Mestre Tetinha, ajudou a fundar a bateria e o bloco de carnaval. Ele é responsável pela sala da bateria e pela manutenção dos instrumentos. “Sempre fui de ficar na beira do campo fazendo samba”, conta ele que toca surdo de segunda.
Com o apoio da prefeitura de Osasco, há 5 anos o Bloco da Coruja desfila uma semana antes do Carnaval nas ruas próximas da sede. Devido a pandemia de Covid-19 nos últimos anos o bloco não saiu às ruas.
Pai de quatro filhos, Tetinha transmitiu o amor pelo Vila para o filho Guilherme, 14. “O que mais gosto no Vila Izabel é de tocar na bateria porque aprendi com meu pai e também a minha relação com ele cresceu por causa do clube porque desde pequeno eu frequento”, conta Guilherme.
Ele faz parte da bateria desde os 7 anos e toca surdo de terceira.
A chegada do filho, para o mestre, resume o sentimento da equipe de Osasco. “O Vila é uma mistura da tradição da velha guarda com os mais jovens”.
Jornalista, acredita que a informação e a educação são ferramentas fundamentais para transformar as pessoas e a sociedade. Gosta de aprender e conhecer coisas novas, estar ao lado das pessoas que ama, ouvir música e ficar junto de suas duas cachorrinhas. Correspondente de Osasco desde 2015.
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