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Top 10: prática expõe a vida íntima de meninas na zona sul

Os Top 10 começaram a ganhar força nas escolas públicas do Grajaú e de Parelheiros, na zona sul, em 2014.

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Por: Redação

Publicado em 24.05.2017 | 15:28 | Alterado em 24.05.2017 | 15:28

Tempo de leitura: 5 min(s)

Listas virtuais nomeadas “Top 10” começaram a ganhar força nas escolas públicas do Grajaú e de Parelheiros, na zona sul, em 2014. A prática, que vai além do rankeamento dos estudantes considerados mais bonitos, expõe a vida sexual, principalmente de meninas. Os adolescentes produzem vídeos com nome e foto das colegas, usam termos como “as 10 mais vadias” e “as 10 mais lésbicas”, e divulgam o conteúdo em redes sociais e plataformas, como YouTube e Whatsapp. Humilhadas e sentindo-se inseguras nas escolas, algumas delas acabam abandonando os estudos e tentando o suicídio. Essa ação é chamada de cyberbullying, atitude agressiva sem motivação específica realizada pela internet.

Para Larissa Sousa, 18, moradora do distrito do Grajaú e integrante do coletivo Perifraseando, a discussão sobre o Top 10 precisa ir além do cyberbullying porque envolve racismo, padrão de beleza e punição à sexualidade feminina. “O que é ser bonito? Então, até o TOP 10, que pode parecer ‘ok’, não é.”, comenta a jovem, que também questiona o ranking sobre a orientação sexual, pois expõe garotas que podem não ter assumido a própria sexualidade. “Imagine se a sua família não aceita isso e ela descobre que você é lésbica dessa forma?” Quando estava no Ensino Médio, Larissa chegou a receber muitos vídeos de rankings e afirma que a disseminação deles continua. “O TOP 10 é visto como uma diversão”.

Dados da SaferNet Brasil, associação sem fins lucrativos que recebe denúncias e oferece orientação on-line a vítimas de violência no ambiente virtual, indicam que em 2016, o quesito que liderou o número de atendimentos foi “cyberbullying/ofensa”. Ao todo foram 202 pedidos de ajuda vindos do público feminino e 110 do masculino. A segunda posição é do “sexting/exposição íntima”, que em 2015 ocupou o primeiro lugar.

Segundo a pesquisa IRBEM 2017 (Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município), a nota média dada pela população de São Paulo em relação ao atendimento às crianças e adolescentes vítimas de violência e risco de morte foi 3,5. Na região chamada Sul 2, onde estão situadas as prefeituras regionais de Parelheiros e Capela do Socorro, onde está situado o Grajaú, a avaliação foi de 2,9, a mais baixa da cidade.

Procuradas pela reportagem, as vítimas de cyberbullying não quiseram dar entrevista.

No combate ao cyberbullying

Os coletivos Abayomi Aba pela Juventude Negra Viva, Perifraseando, Juventude Politizada, Mulheres na Luta e Rusha Montsho criaram, com o apoio do CEDECA Interlagos (Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Interlagos), um projeto para dialogar nas escolas públicas de Parelheiros e do Grajaú e combater o cyberbullying. A ideia é que sejam apresentados dois vídeos produzidos no modelo do TOP 10, mas com falas reflexivas retratando a vítima e aquele que a expõe, e depois ocorra um bate-papo. Ao todo, 15 escolas foram mapeadas e seis já autorizaram a atividade, sendo três no Grajaú e três em Parelheiros. “Se um TOP 10 é elaborado, isso não pode ficar restrito à escola. Tem que ser discutido com pais, educadores, vizinhos, porque é problema de todos. Os professores precisam olhar para isso”, diz Will Ferreira, 27, professor e integrante do Abayomi.

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Humilhadas e sentindo-se inseguras nas escolas, algumas jovens acabam abandonando os estudos e tentando o suicídio (Crédito: Ronaldo Silva/AGECOM)

Junto ao CEDECA Interlagos, os coletivos defendem que a formação de uma rede de diálogo educativo apresenta resultados mais efetivos que qualquer tipo de punição. “Começamos a ver o lado da vítima e também do expositor, já que nem sempre ele é um agressor e também pode ser uma vítima”, diz Luiz Gustavo Gomes, 19, fotógrafo e integrante do Perifraseando. O projeto também inclui a produção de uma cartilha específica para professores.

A psicóloga Mônica Gonçalves, 31, acredita na importância de se fazer parcerias entre profissionais da saúde, professores e assistentes sociais para deter o TOP 10 e suas variantes. “A gente precisa criar redes de diálogo e ação. Cobrem a psicóloga da UBS (Unidade Básica de Saúde)”, sugere a psicóloga. “Essas meninas ficam muito tristes, não têm com quem falar. O suicídio também é uma forma de enfrentamento para elas. Temos que pensar quais são os outros recursos disponíveis antes da pessoa achar que se matar é solução”. Mônica ainda lembra da existência do Programa Saúde nas Escolas, em que psicólogos de UBSs podem atuar em situações como essas.

O portal do MEC informa que o Programa Saúde nas Escolas beneficia estudantes da Educação Básica, gestores e profissionais de educação e saúde. Além disso, as atividades ocorrem nos territórios abrangidos pela Estratégia Saúde da Família, do Ministério da Saúde. O 32xSP solicitou ao órgão a relação de escolas de São Paulo que são beneficiadas pelo Programa, mas não teve retorno até o fechamento da reportagem.

A assistente social Gislaine Barbosa, 35, informa que o SPVV – Serviço de Proteção a Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência da Capela do Socorro, prefeitura regional onde está o Grajaú, fará um trabalho para combater o TOP 10. “Vamos começar a mapear os casos no território [Capela do Socorro] e eles serão trabalhados nos nossos encontros”. Ainda não há previsão para o início.

O SPVV é executado pelo CEDECA Interlagos em convênio com a Prefeitura de São Paulo, por meio da SMADS (Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social). O serviço é ligado ao Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS da Capela do Socorro. Atualmente, São Paulo tem 28 CREAS. Parelheiros não tem nenhum.

O que fazer em casos de exposição

“Quando uma imagem sua é exposta sem autorização, é importante denunciar o conteúdo e as empresas, como Youtube e Facebook, precisam tirá-lo do ar. Caso contrário, elas podem se tornar responsáveis pelo material”, explica Mariana Valente, 30, advogada e diretora do Internetlab, centro de pesquisa independente de direito e tecnologia. Mariana salienta que todas as empresas possuem formulários para que o usuário peça a remoção do conteúdo.

Gisele Truzzi, 36, advogada especialista em Direito Digital, recomenda que a pessoa exposta peça também aos amigos para denunciar o material. “Outra medida é conversar com um advogado para verificar a possibilidade de notificar extrajudicialmente o site ou plataforma em questão. Dependendo do teor e contexto da situação, é possível retirar o material”, completa a advogada. Além disso, é importante registrar uma denúncia na Safernet.

A rede social mais difícil de barrar um material é o Whatsapp. “Apesar dela informar em seus termos de uso que o conteúdo que viole direitos autorais poderá ser identificado e excluído de circulação – o que demonstra que a empresa tem capacidade de identificar e remover determinados tipos de materiais – dificilmente alguém conseguirá, na prática, excluir qualquer conteúdo que circule nos grupos”, finaliza Gisele.

Por fim, psicólogos e advogadas recomendam que os jovens não passem pela situação sozinhos. “É importante conversar com alguém de confiança. De preferência um adulto que possa ajudar”, ressalta Mariana Valente.

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