Número de concorrentes em grupo tem aumentado e, neste ano, é a estratégia para candidatos de diversos partidos nas eleições
Allan Aparecido Gonçalves
Por: Katia Flora | Sheyla Melo | Lucas Rodrigues | Lucas Veloso
Notícia
Publicado em 26.10.2020 | 22:45 | Alterado em 14.11.2020 | 12:19
Com a ideia de que disputar a eleição em grupo pode ampliar as chances de vitória, moradores das periferias de São Paulo e da região metropolitana ampliaram a aposta neste ano na criação de candidaturas coletivas.
Na prática, três ou mais pessoas fazem campanha em conjunto e, caso vençam, assumem coletivamente a cadeira. Na urna eleitoral, aparece o nome e a foto de apenas um dos integrantes, o chamado ‘cabeça de chapa’. Se eleitos, os outros integrantes costumam ocupar cargos no gabinete, mas são considerados pelos membros como co-candidatos.
A iniciativa tem sido usada por partidos de diversas orientações ideológicas, como PSOL, PMB, Rede, PT e PC do B, MDB, Avante e DEM.
Neste ano, a ideia tem sido adotada até mesmo na disputa por uma prefeitura. A ‘Chapa Coletiva Prefeitura SBC’ é a primeira neste formato na região do Grande ABC, em São Bernardo do Campo, onde seis candidatos disputam o cargo de prefeito.
Composto por cinco militantes do PSOL, a chapa terá na urna o nome da advogada Maria de Lourdes de Souza, 64, e da professora Sonia Maria de Almeida, 54, a Soninha, como vice-prefeita.
Além delas, os co-candidatos Aldo dos Santos, professor Paulo Neves e Dianilton Gomes, que é do ramo da construção civil e coordenador da Ocupação do Povo Sem Medo de São Bernardo.
O grupo cita que a inspiração veio por conta da Bancada Ativista, eleita para a Assembleia Legislativa em 2018. “[A candidatura da Bancada] foi bem aceita pela população, pois as ideias precisam ser amplas”, diz Maria de Lourdes.
Para o co-candidato Aldo dos Santos, 67, a disputa coletiva pretende implantar mais igualdade. “Os partidos terão que ser representados na máquina administrativa e fazer valer o voto do eleitorado. É importante governar a partir das periferias”.
A fala vai de encontro a outros nomes que apostaram no formato nas periferias de São Paulo, caso do ‘Quilombo Periférico’.
O grupo forma uma candidatura coletiva com lideranças do movimento negro, da causa LGBTQIA+ e dos agentes de cultura. “Todas as decisões são tomadas coletivamente a partir das considerações do grupo e consultas a lideranças regionais”, diz a geógrafa, arte-educadora e articuladora social Elaine Mineiro, 36.
A chapa é formada por Alex Barcellos, da Agência Solano Trindade, na zona sul, Erick Ovelha, agente cultural do Bloco do Beco, Júlio Cézar de Andrade, babalorixá e mestre em serviço social, Samara Sosthenes, travesti, estudante de meio ambiente e articuladora social no Centro de Cidadania LGBTI sul, e Débora Dias, estudante de ciências sociais e coordenadora da UNEafro Brasil.
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Segundo Elaine, historicamente os quilombos foram espaços de organização e resistência do povo negro e escravizado. Nos dias atuais, essa população se concentra nas periferias da cidade.
Ela diz que o grupo reconhece que a periferia só será representada de fato e no centro do debate da cidade quando houver lideranças dessas regiões em espaços de poder, como a Câmara dos Vereadores.
Na campanha, o grupo tem dialogado com lideranças, terreiros, comunidades de base, associações, por contato telefônico e visitas.
“Tudo dentro dos limites estabelecidos pelo Ministério da Saúde, pela Covid-19”, afirma o mestre em ciências sociais, morador de Guaianases e ex-conselheiro tutelar, Júlio Cézar de Andrade, 34. “Por meio de plenárias coletivas nós estamos construindo as nossas propostas para o nosso plano de gestão após a nossa posse”.
“Antes da pandemia, o povo preto já vinha sofrendo opressões. Com a pandemia isso tem se intensificado, as desigualdades social e econômica”, resume.
De acordo com o estudo Mandatos coletivos e compartilhados: desafios e possibilidades para a representação legislativa no século 21, no Brasil, entre os anos de 1994 e 2018, foram mapeadas 110 pessoas que optaram, em suas candidaturas, pelas lógicas coletivas.
Os pesquisadores da RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), responsáveis pelo levantamento, apontam que o modelo existe no país há mais de 20 anos.
No entanto, nas eleições municipais de 2012 e as eleições gerais de 2014 houve crescimento no modelo, quando houve sete candidaturas e cinco mandatos eleitos. Nas eleições de 2016, o maior salto – 98 candidaturas.
No Jardim Rosana, na região do Campo Limpo, zona sul da capital, a chapa ‘A Voz da Periferia’, do PMB (Partido da Mulher Brasileira), é formada por 10 moradores da comunidade, dentre eles Alexandre Mariano, 51, a sobrinha Michele Mariano, 36, e o administrador de empresas Robério Benedito, 37.
Segundo Michele, o convite foi aceito para tentar melhorar a saúde municipal. “Tive um câncer de mama e só fui atendida porque minha irmã trabalha nas clínicas [Hospital das Clínicas] há 20 anos e conseguiu um encaixe pra mim. Se não fosse isso eu teria morrido”, diz. “Se a gente precisar fazer um exame, mas demora seis meses para marcar, a pessoa morre. Tem muita dificuldade na saúde”.
Para Alexandre, o diferencial da chapa é o empenho de todos os membros com as pautas das pessoas que moram nas periferias, apesar da descrença dos moradores na atividade política, e que o desafio maior é conseguir passar credibilidade para os eleitores.
Por outro lado, Doraci Mariano, 59, coordenador político do partido, diz que cada integrante da chapa tem uma meta de votos para conseguir, e isso pode ser mais fácil porque é “gente da comunidade que todo mundo conhece”.
Robério Benedito, o líder da chapa, diz que já existe planejamento interno, no caso da chapa eleita. “Vamos montar estratégias em que cada membro da chapa tenha uma localidade, uma administração para que ninguém fique sobrecarregado”, comentou.
“A gente não pode ter dentro do gabinete uma pessoa que só entenda de cachorro, por exemplo. Tem que ter gente que entende de cachorro, de saúde, de esporte, de lazer e da terceira idade”.
Jornalista com experiência em jornalismo online e impresso, tem publicações em diversos veículos, como Uol, The Intercept e é ex-trainee da Folha de S. Paulo no programa para jornalistas negros. Correspondente de São Bernardo do Campo desde 2014.
Pedagoga, estudante de jornalismo, correspondente de Guaianases desde 2017. Pernambucana, rapper, ativista e educadora social. Co-gestora do grupo Arte Maloqueira. Articula projetos com produção de comunicação comunitária e literatura periférica.
Jornalista apaixonado por jornalismo de dados e pela LAI. Correspondente do Jardim Rosana desde 2019.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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