Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
Por: Nathália Ract da Silva
Notícia
Publicado em 05.05.2025 | 8:28 | Alterado em 05.05.2025 | 8:33
Em meio ao avanço dos brinquedos digitais, o artista visual Bruno, mais conhecido como Perê, 40, revive a ideia de apoiar as crianças e jovens na construção dos próprios brinquedos. Carrinhos de rolimã, bonecos articulados, bagatela e câmera escura estão na lista do que ele ensina.
“Devemos incentivar a criação e o “fazer” em vez de apenas consumir produtos prontos, que já vêm “brincados de fábrica”, defende o morador do Jabaquara, na zona sul de São Paulo.
“O brincar é ancestral, mas hoje, adquirir brinquedos prontos ficou fácil e mais barato, entretanto, esse “fácil” pode sair caro”, reflete o artista.
Pai de Violeta, Perê é educador, artista visual e grafiteiro. Engenhoso e acostumado a inventar brinquedos e gambiarras desde a infância, trabalha realizando oficinas em instituições culturais como SESCs, Fábricas de Culturas, Oficinas Culturais, ONGs, associações e iniciativas independentes organizadas por coletivos.
Perê monta os brinquedos de madeira no seu ateliê @Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
Como educador e pai, ele percebeu o quanto o brincar e o criar são indissociáveis. Ele conta que quando a filha nasceu, começou a criar itens em casa junto com ela.
“Alguns brinquedos despertavam mais interesse conforme a idade dela avançava, mas o fazer já era, por si só, um momento de brincadeira. Aquele pedaço de madeira, antes mesmo de se tornar um brinquedo, já era um cavalo, uma boneca, um boi ou um carro”, comenta Perê.
‘O desenvolvimento infantil se enriquece muito mais com o ato de criar do que simplesmente consumir’
Perê
A forma como ele percebe e olha para o brincar tem a ver com o percurso pessoal e profissional. Ao longo da vida, morou em muitos lugares, mas na infância, passou a maior parte do tempo no Jabaquara, no quintal dos avós maternos.
“Como eu tinha um quintal com terra e restos de construção, lembro de fazer caminhõezinhos para carregar areia, adorava fazer caixinhas de tesouro e enterrá-las, fazer bolo de areia, cidades de pedras”, relembra Perê.
Nas oficinas, as crianças aprendem a produzir um boneco acrobata entre outros objetos @Nathália Ract da Silva/Agência Mural
Além das brincadeiras e brinquedos que fazia sozinho, ele se lembra de alguns que teve ajuda para construir. “Meu pai me ajudou a fazer uma perna de pau com cabo de vassoura e um carrinho de rolimã. Já minha mãe me ensinou a fazer pipa peixinho”, conta.
Anos depois, na Fábrica de Cultura do Jardim @São Luís@, Bruno Perê seria desafiado pelas crianças no primeiro dia do curso a construir um carrinho de rolimã. Foi nesse momento, em 2013, que ele iniciou o trabalho com brinquedos. Lá, ele pôde desenvolver um processo contínuo durante dois anos com crianças a partir de 8 anos de idade.
“Um dos brinquedos que criei que eu gosto bastante é a câmera escura”, relata. Ele pediu às crianças que trouxessem de casa rolos de papel higiênico, e reutilizaram as caixinhas de suco que elas recebiam no lanche.
“Comprei algumas lupas e, com esses materiais, montamos uma câmera escura de caixinha de suco, onde elas podiam ver as imagens de ponta-cabeça devido ao processo óptico da lente da lupa”, explica sobre o processo criativo.
Entre os anos de 2022 e 2023, o artista visual percorreu diversas unidades das Fábricas de Cultura para realizar as oficinas de carrinho de rolimãs com as crianças e adolescentes das periferias da cidade de São Paulo.
Perê ao lado da placa "Artistas trabalhando" @Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
Oficina do Perê fica na zona sul de Sãio Paulo @Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
Câmera fotográfica feita de madeira @Nathália Ract da Silva/Agência Mural
Brinquedos construídos pelo Perê @Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
Protótipo do brinquedo Boneco Articulado @Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
Boneco acrobata criado em oficina @Nathalia Ract da Silva/Agência Mural
No início das oficinas, Perê costuma fazer duas perguntas básicas: “quem já brincou com esse brinquedo? e quem já fez esse brinquedo?” e conta que muitos já brincaram, mas, às vezes, nunca tiveram a oportunidade de construí-lo. É justamente nesse momento que há uma troca geracional entre adultos e crianças, um espaço de interação entre pais e filhos, educadores e frequentadores.
Em 2025, o artista visual realizou as oficinas “O Acrobata e outros autômatos” no espaço de tecnologia e artes do Sesc Santana. Thais Franco, 42, moradora do bairro da Vila Medeiros, foi uma das participantes.
“A oficina de criação de brinquedos fortalece a interação entre pais e filhos. Em tempos de muitas telas e jogos disponíveis na internet, é importante estimular as crianças na criação de brinquedos e brincadeiras lúdicas e criativas “, afirma.
Terezinha e a filha após finalizar o boneco na oficina do artista Perê @Nathália Ract da Silva/Agência Mural
Outra participante do projeto, Terezinha Rodrigues, 47, moradora do bairro Jardim Peri Alto, se recorda que no tempo de criança, quando ela morava na roça, tinha o costume de criar muitas brincadeiras e brinquedos.
“Enquanto ajudava a minha filha a criar o boneco trapezista, estava lembrando de quando criava algumas coisas do passado. Construí uma peteca com meia e colocava algumas penas para decorar. Bonecas de pano, que nós mesmos construímos o corpinho, as mãozinhas, e o cabelo com a espiga de milho”, conta.
Todas as oficinas realizadas pelo Bruno Perê são gratuitas e as crianças podem levar os brinquedos para casa. As oficinas se parecem com um “quintal” de vivências”, que estimula ideias e descobertas que surgem das próprias crianças e jovens participantes. Conheça mais o trabalho de Perê no Instagram.
Historiadora e Fotojornalista. Realizadora do documentário curta-metragem "Chile de olhos bem abertos". É contadora de histórias na biblioteca da Fábrica de Cultura do Jaçanã. Correspondente do Jaçanã desde 2023.
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