Por: Bruna Nascimento
Notícia
Publicado em 19.06.2020 | 19:18 | Alterado em 19.06.2020 | 19:39
Produzido em casa, filme é baseado na história da família do diretor, que recebe a notícia de que um familiar está com suspeita de coronavírus
Tempo de leitura: 3 min(s)O som da máquina de costura, enquanto a mãe produz máscaras para doar ou vender. Conversas temerosas sobre o futuro do emprego do pai. Mensagens de voz de uma tia doente, com suspeita de Covid-19. A televisão transmitindo notícias sobre o novo coronavírus.
Tudo isso passou a fazer parte da rotina do produtor audiovisual Douglas Cordeiro, 26, durante o isolamento social. E virou o roteiro do curta-metragem ‘E daí?’. Escrito, dirigido, filmado e editado por ele em casa, em Suzano, na Grande São Paulo. a obra conta com a família de Cordeiro no elenco.
No mês de abril, a mãe de Douglas, a costureira Maria Daguia, 51, recebeu a notícia de que a irmã que mora em Itapetim, cidade do Pernambuco com cerca de 16 mil habitantes, estava com suspeita de Covid-19. As preocupações da família e as mensagens de voz enviadas pela tia deram origem à história narrada no filme.
Cordeiro está cumprindo o isolamento social e trabalhando no esquema ‘home office’ desde março. Ele é coordenador audiovisual em uma agência de comunicação na cidade de Itaquaquecetuba. Dirigiu e participou de diversas produções independentes, como roteirista e editor. Foi premiado nos festivais ‘Off cine’ e ‘Curta Suzano’.
O produtor audiovisual conta que pensava em fazer um filme desde o início da pandemia, mas só foi possível após ele se adaptar à nova rotina.
“Brinco que uma das coisas que sinto mais falta é andar de trem, porque via pessoas, tinha essa coisa de ficar observando tudo que está ao meu redor. Só que quando comecei a me adaptar dentro de casa, comecei a ver que tinha história aqui dentro”, conta Cordeiro.
VEJA TAMBÉM:
Confira o avanço de casos de Covid-19 na Grande São Paulo
Se sair, não leve o coronavírus para casa; Veja orientações
Sepultadores relatam pressão no trabalho e o preconceito contra a profissão
O curta foi gravado em um dia e editado em uma semana. O criador do filme explica que pensou em uma narrativa e uma forma de filmar que não precisasse de muitos cortes. Buscou maneiras para deixar os atores, seus pais, à vontade. Eles não estavam acostumados com a câmera e o processo de filmagem.
“Acho que foi mais fácil pra eles porque eles tiveram que fazer eles mesmos. Eu escrevi o roteiro e tudo mais, com algumas falas que observei que faziam parte do dia a dia, mas na hora de filmar eu falei: ‘improvisem, façam o que for legal aí pra vocês’. E deu muito certo”, conta.
Para Maria Daguia, que estrelou o filme, a produção foi cansativa. Mas diz que o filho é um diretor paciente. “É engraçado, na hora que ele começou a gravar ele não era aquele ‘meu Douglas’. Era aquele diretor que surgiu de repente. Ensinando tudo.”, diz.
Os áudios que aparecem no curta são as mensagens de voz originais, trocadas entre as irmãs. As lágrimas de Daguia, presentes em uma cena, também foram reais.
A mãe conta que se emocionou ao ver a família se tornar a trama de uma produção dele. “Fiquei muito feliz pelo meu filho fazer essa homenagem para minha irmã, quando a gente terminou o filme eu liguei pra ela e a gente chorou muito juntos”, relata Daguia.
A tia chegou a ir para o hospital, mas foi enviada para casa sem testes. Ela se recuperou dias depois e não sabe se teve ou não Covid-19.
O título ‘E daí?’ faz referência à fala do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), após uma jornalista dizer a ele que o país tinha ultrapassado o número de mortos por Covid-19 da China. Na ocasião, o Brasil tinha atingido a marca de 5.000 mortos.
Nesta semana, o país chegou a mais de 47 mil. Em Suzano, são 1.189 casos e 88 perdas. Na Grande SP, são mais de 9 mil mortes.
“Foi um monte de coisa que estava me incomodando e os temores dos meus pais que eu via no dia a dia. Tinha o fato da doença, mas também tinha a coisa do desemprego”, diz o diretor. “Existe uma tensão em volta disso. Ver isso dentro de casa foi uma coisa bem impactante”
Sobre a escolha do nome, enfatiza que alguns pronunciamentos incomodaram, tendo em vista a gravidade da situação. “Eu queria passar isso para o filme. Daí vem o nome “E daí?”, diz. “E daí que tem vida por trás, e daí que tem pessoas e histórias pessoais”.
Fotojornalista, sonhadora, observadora e ouvinte de 'causos' profissional. Corinthiana maloqueira e sofredora (graças a Deus), boa sujeita, pois gosta de samba e tal qual Candeia na voz de Cartola, precisa se encontrar e vai por aí a procurar. Correspondente de Suzano desde 2019.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
Se você quer saber como republicar nosso conteúdo, seja ele texto, foto, arte, vídeo, áudio, no seu meio, escreva pra gente.
Envie uma mensagem para [email protected]