Por: Redação
Publicado em 26.10.2018 | 12:14 | Alterado em 22.11.2021 | 15:43
Moradores da zona leste contam as dificuldades para acessar o esporte; modalidade completa dez anos do primeiro jogo com equipamentos completos no país
Tempo de leitura: 3 min(s)Sábado, 12h, sol estalando. Enquanto as ruas do Jardim Keralux, na zona leste de São Paulo, estão cheias por conta dos comércios, um time pratica futebol americano nos gramados do centro de treinamento da Portuguesa.
Dos 33 atletas em campo, apenas quatro são negros. Nesta semana, o esporte completou 10 anos da primeira partida oficial no Brasil com todos os equipamentos. No entanto, a modalidade avançou pouco na questão da diversidade e na difusão em espaços periféricos.
Um dos atletas da Lusa é Nathan Santiago, 28, morador de Itaquera, que teve em 2007 a oportunidade de conhecer um time de futebol americano na zona leste.
Depois do início, ele parou de jogar por causa do trabalho mas retornou há três anos, após convite do técnico da Lusa. A equipe é a segunda colocada no grupo Oeste da Conferência Sudeste da BFA 2018 (Brasil Futebol Americano).
“É um esporte para poucos negros [no Brasil], o inverso do que acontece no esporte original. Se você olha nos EUA, os melhores jogadores são negros”, pontua Santiago.
O publicitário Ingo Silva, 23, de Itaquera, é outro jogador negro no time. Ele começou a praticar depois de conhecer a equipe do Corinthians.
“Hoje a torcida dos times é composta de amigos e familiares, então, se tem menos negros em campo vão ter menos negros na torcida”, explica. “As famílias negras não vão na arquibancada, nem os amigos negros, quando não tem um igual jogando”, completa.
Para o atleta, é importante que os times no país se desenvolvam a ponto de permitir que os mais pobres também consigam acessar o esporte. O preço de itens como coletes e chuteiras são apontados como empecilhos para a prática da modalidade. Eles estimam o custo de R$ 2.000 para entrar no esporte.
Apesar do crescimento no Brasil, a adesão ao esporte não foi o suficiente para a produção em massa de equipamentos do futebol americano, o que dificulta o acesso. Quem se interessa precisa recorrer a amigos que viajam ao exterior para trazerem os itens, a preços menores e com maior durabilidade.
“Ninguém tem grana pra jogar, assim à vista, de um dia pro outro. Isso é barreira de entrada para galera começar a jogar”, comenta Ingo. “O que acontece muito é que tem gente que começa sem equipamento, vai entrando e aí, se realmente curtir, faz um esforço para comprar, ou eventualmente larga o esporte por não ter dinheiro”, exemplifica.
ALTA
Em fevereiro de 2017, uma pesquisa do Ibope Repucom apontou que 15,2 milhões de pessoas se declararam fãs do esporte no Brasil.
Morador de Guarulhos, Leandro Silva de Oliveira, 22, ocupa a posição de safety – responsável por ficar na última linha de defesa e não deixar que os atacantes permaneçam com a bola.
O atleta levou dois anos para comprar todos os itens necessários para jogar. Primeiro, juntou dinheiro e comprou o capacete e o shoulder – ombreira que protege o peito e ombro – e meses depois conseguiu adquirir tudo o que precisava para seguir jogando.
“O equipamento é uma barreira mesmo no esporte. Em Guarulhos, não tem muito apoio, tem que buscar fora [da cidade]”, resume.
Com o aumento da visibilidade no Brasil, Silva diz acreditar que os clubes passarão a crescer e com isso ter estrutura suficiente para manter as despesas exigidas pelo esporte.
“Não vai precisar ter dinheiro para jogar, você vai jogar, mesmo que não seja seu o equipamento, mas pelo menos as pessoas vão ter como entrar, sem pedir emprestado. Trocar é complicado, eu mesmo batalhei para pedir emprestado”, relembra.
Outra questão em comum entre os jogadores é a profissionalização, o que não deve ocorrer em curto prazo. “Eu sei que minha geração não vai jogar profissionalmente, a gente está trabalhando para o futuro das próximas gerações, que consigam jogar profissionalmente, mas a minha eu sei que não. Jogo porque gosto”, declarou Oliveira. “Somos o pilar de uma geração que pode ser profissional”, vislumbra Santiago.
Lucas Veloso e Rômulo Cabrera são correspondentes de Guaianases e Suzano
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