Para comunicadores, a entrada dos jovens negros na universidade representa maior espaço da mídia negra na produção de notícias
Por: Lucas Veloso | Paulo Talarico
Notícia
Publicado em 04.07.2019 | 12:11 | Alterado em 23.07.2019 | 10:07
Para comunicadores, a entrada dos jovens negros na universidade representa maior espaço da imprensa negra na produção de notícias
Tempo de leitura: 3 min(s)Quando se fala na história da imprensa no Brasil, o que é comentado sobre a imprensa negra, nas salas das universidades ou mesmo quando se fala da profissão? Este questionamento esteve presente em duas mesas do congresso da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo).
O tema surgiu em mesas que debatiam o jornalismo na periferia e aquilo que a imprensa não mostra. O questionamento era o quanto essa história não está dentro da cobertura, além do trabalho realizado por essa mídia que pauta a questão racial como política editorial.
Criado em 1833 pelo jornalista, poeta e livreiro Francisco de Paula Brito, o “O Homem de Côr” é considerado o primeiro jornal brasileiro a falar sobre negritude, apenas 25 anos depois da Gazeta do Rio de Janeiro, considerado o primeiro veículo brasileiro.
A proposta do veículo era a luta contra a discriminação racial, cinco décadas antes da abolição da escravatura no país.
“Quem decide quem é mídia e quem não é?”, questionou Donminique Azevedo, durante a palestra “O que a mídia não mostra, nós mostramos”.
Pós-graduanda em gênero, raça e sexualidades pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), ela trabalhou no Correio Nagô, da Bahia, veículo voltado a cobertura das ações da comunidade negra no Brasil. Recentemente, ela lançou o Hiatus, plataforma que trabalha com infográficos no Instagram para mostrar dados que são invisibilizados.
Um dos pontos que ela menciona com relação a imprensa negra é o fato de esse jornalismo muitas vezes ser diminuído com o tom de que não é jornalismo. “Tratam como se fosse apenas ativismo”.
“Mas precisa diferenciar como imprensa negra?”, questionou uma das pessoas a acompanhar a mesa. “As pessoas que atuam com esse trabalho preferem que sim”, disse Donminique.
Quem também mencionou essa história foi Pedro Borges, jornalista e um dos fundadores do portal Alma Preta, veículo especializado na temática racial. Para ele, o racismo é o principal elemento que impede destaque aos marcos históricos das pessoas negras.
“O apagamento desse canal de mídia é fruto do racismo que mata o povo negro, também pelo seu apagamento. Nós chamamos de epistemicídio, o apagamento simbólico, intelectual do que fazemos e produzimos”, define.
“A primeira mídia não hegemônica existente no Brasil foi a negra. E foi apagada, mesmo com toda a sua importância. Também quem fundou o veículo tem grande importância para o país, já que ele é quem, anos depois, publica Machado de Assis, o maior escritor brasileiro”, defende Borges.
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Para Borges, apesar dos conhecimentos técnicos, os jornalistas negros sempre enfrentaram o desinteresse do mercado em investir em seus editoriais, mas nas últimas décadas, com o aumento dessa população nas faculdades, a realidade é mais favorável. E isso é parte da mudança no cenário.
“Precisamos de um público leitor, engajado contra o racismo. Nós temos, cada vez mais, a juventude negra das periferias, nas universidades, públicas e privadas, e elas têm feito uma diferença grande, pois criam outras possibilidades”, salienta.
O Censo do Ensino Superior, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), trouxe o aumento no número de matrículas dos estudantes negros em cursos de graduação. Em 2011, 11%. Em 2016, ano do último Censo, o percentual de negros matriculados subiu para 30%.
“É uma juventude que vai se colocar contra o racismo, disputar espaço e fortalecer a mídia negra”, continua. “Imagina no século passado, brancos sem interesse em nossa produção e negros recém libertos do escravismo, era pequeno o público. Hoje a gente tem o público maior, mais engajado. Conseguimos lapidar a linha editorial”, compara.
Diretor de Treinamento e Dados e cofundador, faz parte da Agência Mural desde 2011. É também formado em História pela USP, tem pós-graduação em jornalismo esportivo e curso técnico em locução para rádio e TV.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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