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Agência de Jornalismo das periferias

Léu Britto/ Agência Mural

Por: Artur Ferreira

Notícia

Publicado em 25.08.2025 | 18:23 | Alterado em 01.09.2025 | 10:30

Tempo de leitura: 5 min(s)

Há 10 anos, moradores das periferias da zona norte da capital paulista convivem com sons de maquinário em obras, explosões, rachaduras nas paredes e promessas. Muitas promessas.

Em 2015, o Consórcio Move São Paulo iniciou a construção da Linha 6-Laranja do Metrô de São Paulo, com conclusão prevista para 2020. Porém, após uma sucessão de problemas, atrasos e quebras de contrato, a obra deve ser finalizada apenas em 2027, segundo o Governo do Estado de São Paulo.

Obras da Linha Laranja causam trânsito e movimentação intesa de máquinas @Léu Britto/ Agência Mural

“Essa promessa do metrô existe há muito tempo, lembro desde quando eu era criança”, conta a psicóloga Suellen Gomes Claudino, 29. A memória não falhou: o lançamento da linha foi anunciado em 2008, pelo então governador de São Paulo José Serra (PSDB).

Com 15 estações, a promessa era conectar a Brasilândia, na zona norte, até a estação São Joaquim, na região central da capital. De acordo com o Governador Tarcísio de Freitas, após anos de espera, a linha deve começar a funcionar parcialmente no final de 2026.

“Os ônibus sempre estão cheios, não comportam a quantidade de pessoas indo para o centro. Meu noivo demora 1h30 para chegar. O metrô iria facilitar muito”.

Suellen Gomes Claudino, 29

O projeto da Linha 6-Laranja é administrado pela concessionária Linha Uni desde 2020. Pelas projeções, com o metrô, um trajeto antes feito em 1h30 da Brasilândia até a estação São Joaquim seria encurtado para 23 minutos. Em nota, a Linha Uni afirma que a Linha 6-Laranja terá 15,3km de extensão, e transportará, em média, 633 mil passageiros por dia.

A Linha Uni, pertencente ao grupo espanhol Acciona, foi a segunda concessionária a administrar a linha. O primeiro consórcio, o Move São Paulo, era formado pelas construtoras Odebrecht, Queiroz Galvão, UTC Engenharia, porém foi alvo de investigações na operação Lava Jato e abandonou o projeto em 2018.

Segundo a pesquisa Mapa da Desigualdade 2024, da Rede Nossa São Paulo, a Brasilândia figura entre os piores distritos da capital paulista quando o tema é mobilidade urbana: está na posição 90 entre os 96 analisados no ranking de mobilidade, que analisa velocidade média de ônibus, acesso a infraestrutura cicloviária, acesso a transporte de massa e tempo médio de deslocamento por transporte público.

“A primeira vez que eu ouvi sobre essa obra foi na época da Copa do Mundo de 2014, e ficou só na promessa, até hoje”, conta o líder comunitário e produtor cultural Rodrigo Olegário, 47.

Olegário, líder comunitário na Brasilândia @Léu Britto/ Agência Mural

Segundo a Secretaria de Parceria em Investimentos (SPI) do Governo do Estado de SP, as obras como a Linha 6-Laranja “seguem o cronograma previsto, com o primeiro trecho entre Brasilândia e Perdizes programado para o segundo semestre de 2026“.

De acordo com a nota, a linha 6-Laranja, faz parte do programa “SP nos Trilhos”, com gastos previstos de R$190 bilhões para melhorar a mobilidade urbana na capital, na Grande São Paulo, no interior e no litoral.

Rachaduras e desapropriações

“É uma promessa cheia de falhas. Não estudaram o terreno [da Brasilândia], tem muitas casas que foram afetadas com trincos nas paredes e rachaduras devido a explosões durante a obra”, relembra o Olegário. “Vários amigos meus foram desapropriados das suas casas, e remanejados para outras regiões da cidade”.

Rachadura na parede de casa na Brasilândia próxima à obra do metrô @Léu Britto/ Agência Mural

O também líder comunitário e servidor público Cláudio Rodrigues conheceu pessoas que ao perderem suas casas para as obras do metrô precisaram se mudar para outras regiões e até mesmo outras cidades da Grande São Paulo, como Caieiras e Franco da Rocha.

“O impacto das obras é muito significativo: ruas são fechadas, itinerários de ônibus são alterados e isso leva muito sofrimento para quem mora perto das obras”.

Um levantamento feito a partir de notícias publicadas na revista Veja e no jornal Diário Zona Norte aponta ao menos 371 desapropriações de imóveis na Brasilândia, afetando famílias e comerciantes da região.

Em nota, a concessionária Linha Uni, afirma que as realocações de moradores “ocorrem apenas em situações específicas e seguem procedimentos usuais para empreendimentos dessa natureza, sempre priorizando a segurança e o bem-estar dos envolvidos”.

A Linha Uni também afirma que “todos os moradores foram previamente informados e acordos foram formados de maneira individual […] sempre com a concordância dos ocupantes dos imóveis”. Segundo a empresa, os contratos estão protegidos por termos de confidencialidade.

Sorveteria próxima às obras do metrô apresentam rachadura na parede @Léu Britto/ Agência Mural

Horas perdidas

Olegário precisa ir ao centro da cidade com frequência e, dependendo do ônibus Brasilândia – Praça Do Correio (8542/10), gasta no mínimo 1h40. Com trânsito, a rota pode levar até 2h dentro do transporte público. “Com o metrô eu levaria 40 minutos para estar na região central”, sonha Olegário.

Enquanto a linha não é inaugurada, Olegário pretende organizar uma audiência pública com moradores e autoridades para protestar contra o cancelamento da linha de ônibus, Jardim Paulistano-Praça do Correio (8214/10). Ele está se articulando com outras lideranças comunitárias para fazer um pedido oficial para promover o debate.

“Era uma das linhas mais rápidas para chegar até o centro, passava pelo Fórum Trabalhista e Criminal, passava pelo Bom Retiro… mas a prefeitura cortou a linha”, lamenta. “E mesmo com a vinda do metrô, não devemos excluir outros meios de transporte, porque assim você acaba lotando essas novas estações”, desabafa Olegário.

“A primeira vez que eu ouvi sobre a obra foi em 2014 e ficou só na promessa”, diz Olegário @Léu Britto/ Agência Mural

Segundo a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana e Transporte (SMT), e a SPTrans, o ônibus 8214/10 foi unificado com a linha 8215/10, também nomeada de Jardim Paulistano-Praça do Correio, em 2015. E em nota, a Secretária afirma que a remoção da linha não tem “qualquer relação com o projeto de implantação da Linha 6-Laranja do Metrô”.

O líder comunitário Cláudio Rodrigues fez uma escolha difícil e para poucos: ir para o trabalho de carro. “Eu trabalho à 22 km da minha residência, em Moema [zona sul de São Paulo]. Teria que pegar dois ônibus e três metrôs para chegar. Eu trabalho oito horas por dia e gastaria o tempo de metade da minha jornada apenas para ir e voltar.”

Com o carro, as quatro horas gastas no deslocamento se tornaram duas, mas com o metrô poderia ser reduzida para uma 1h20, por um preço mais baixo e muito menos impacto ambiental.

Canteiro de obras da Linha Laranja do metrô @Léu Britto/ Agência Mural

“Eu usaria esse tempo para descansar, estar com a minha família ou praticar algum esporte que me traga qualidade de vida”, conta Cláudio, que é também presidente do Instituto Transformação Cidadã, uma organização que promove ações voltadas ao esporte, lazer, cultura e geração de renda na região. “Para sair da Brasilândia, normalmente, é preciso pegar mais de um ônibus. Para ir para Pirituba, bairro vizinho, tem que pegar dois ou três [dependendo do local]”.

Em nota, a SPI e o Governo do Estado afirmam que: “além da Linha 6, o Estado viabilizou a ampliação da Linha 4-Amarela até Taboão da Serra”, com obras previstas para começar ainda em 2025 e entrega estimada para 2028. Além disso, também tem projetos de expansão da Linha 5-Lilás e estudos das futuras linhas 16-Violeta, 19-Celeste, 20-Rosa e 22-Marrom.

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Artur Ferreira

Jornalista e redator. Atuou nas redações do Observatório do Terceiro Setor e Rádio CBN. Adora livros, cinema, podcasts e debater sobre política internacional. Palmeirense. Correspondente do Jardim São Luís desde 2022.

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