Para o cientista político Marcos Agostinho, eleição de 2024 na Grande SP foi marcada por pouca alternância de poder e fortalecimento de partidos de centro-direita
Léu Britto/Agência Mural
Por: Artur Ferreira
Notícia
Publicado em 13.11.2024 | 17:04 | Alterado em 13.11.2024 | 17:04
Nas últimas décadas, os partidos de esquerda, que sempre defenderam representar as periferias da Grande São Paulo, se desconectaram dos interesses das quebradas e não dialogam mais com os interesses dos jovens periféricos. Essa é a opinião do sociólogo e cientista político Marcos Agostinho, que analisou os resultados das urnas após as primeiras articulações dos eleitos.
“Não houve formação de novas lideranças. Esses partidos [de esquerda] não acompanharam a mudança da cabeça do jovem periférico [na faixa dos] 20 anos”, avalia Agostinho, que acredita que esse distanciamento causou um “vácuo de poder” nas quebradas da região metropolitana de São Paulo.
Mas o poder não deixa vácuos. Partidos mais conservadores conseguiram se aproximar das juventudes periféricas e prometem responder a um dos seus principais sonhos e desejos: melhorar de vida empreendendo, com um negócio próprio.
O principal expoente desse movimento foi o candidato à prefeitura de Pablo Marçal (PRB) que disputou voto a voto do primeiro turno com um discurso antipolítica e pró empreendedorismo individual.
‘Hoje o que há de mais revolucionário [na política municipal] é a eleição de mulheres negras e periféricas. São elas as que mais sabem o que é e como é a vivência das periferias’
Alguns nomes importantes com esse perfil vão ocupar a Câmara Municipal da capital paulista, como as vereadoras Keit Lima (PSOL), Luana Alves (PSOL) e Amanda Paschoal (PSOL).
Nos 39 municípios da Grande São Paulo, partidos da direita e do centro, em especial PL, Podemos, PSD e MDB, elegeram mais prefeituras e vão controlar a maior fatia que orçamento público da região. O movimento segue “o que ocorre no Congresso Nacional”, como afirma Agostinho.
A guinada para o centro-direita ocorreu por diversos motivos, mas um dos mais determinantes foi o orçamento que os partidos designaram para as eleições e a transferência de verba direta do Congresso Nacional para os municípios, por meio das chamadas emendas pix, um modelo de transferência de verba pública sem transparência e fiscalização.
“O atual governo Lula, para conseguir manter a governabilidade, precisou entregar parte do orçamento aos partidos conservadores do Congresso por serem maioria na Câmara dos Deputados”, explica o cientista político. “Esses partidos buscaram reforçar suas bases [municipais] durante essas eleições com maiores orçamentos para suas campanhas.
Para ele, a eleição de Ricardo Nunes (MDB) é uma confirmação da influência do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) nas periferias de São Paulo.
‘Os partidos conservadores e de centro temiam a eleição de [Guilherme] Boulos [candidato do PSOL à prefeitura de São Paulo]. Eles queriam evitar que a capital se tornasse um ponto de influência da esquerda, que discordaria do governo estadual’
As tendências são percebidas com as altas taxas de reeleição ou de continuidade dos partidos no governo, que ocorreram em diversas cidades da Grande São Paulo. Entre elas estão Osasco, com Gerson Pessoa (Podemos), Santo André, com Gilvan Júnior (PSDB), e Cajamar, com Kauan (PSD), candidatos preparados para herdar as prefeituras.
O PT, um dos principais partidos do país, conseguiu eleger apenas uma prefeituras da Grande São Paulo: Mauá, no ABC Paulista, base histórica do partido.
“Com a concentração de fábricas e metalúrgicas, o PT construiu uma base que se identificava com as pautas propostas”, explica Agostinho. “Porém, nos últimos anos, houve uma mudança na configuração do que se entende de trabalho, os sindicatos perderam força e o sonho do jovem não é mais fazer um curso e ser metalúrgico”, analisa o cientista político.
Para ele, o sonho do jovem trabalhador hoje é se tornar patrão de si e ser um empreendedor. Além disso o trabalho passou a ter outra dinâmica com a popularização de aplicativos de transporte e entrega, a maior dificuldade para conseguir um emprego com carteira assinada. “Hoje, o trabalhador se vê como ‘colaborador’”, aponta.
“Durante os governos petistas, movimentos como a CUT e as centrais sindicais se tornaram aliados do governo. Como você vai instigar a luta sindical e as greves se você é aliado?”, questiona.
Para Agostinho, na história da política é natural que grandes partidos passem por um “ciclo”: primeiro ascendem e até mesmo conquistam governos estaduais e federais; depois de alguns anos de governabilidade, iniciam sua queda e até mesmo fim da sigla partidária.
“Esse ciclo se cumpriu para o PSDB na Grande SP. A derrocada começou com a derrota de Aécio Neves nas eleições de 2014, [que além de perder] ainda questionou a vitória de Dilma. [Depois] a ascensão de João Doria, que queria ser essa nova liderança do partido, causou um racha entre ele [Geraldo] Alckmin [atual vice presidente da república]”.
A “pá de cal” do partido tucano foi justamente a saída de Alckmin do partido e a aliança dele com o presidente Lula. Desta forma, o PSDB perdeu sua maior liderança estadual em São Paulo e ocorreu um efeito dominó nos municípios paulistas. Em 2024, na Grande São Paulo, o PSDB só se elegeu em Santo André.
Nesse cenário, o que esperar das campanhas eleitorais no futuro? Agostinho acredita que elas devem ser tornar cada vez mais “personalizadas e personificadas”, como classifica. “Os candidatos vão buscar ser influenciadores, se mostrar como pessoas humanas próximas da realidade da periferia nas redes sociais”.
O objetivo final é gerar identificação fazendo da política algo pessoal e passional. “O objetivo é fazer com que as pessoas votem em pessoas, não necessariamente em propostas”.
Jornalista e redator. Atuou nas redações do Observatório do Terceiro Setor e Rádio CBN. Adora livros, cinema, podcasts e debater sobre política internacional. Palmeirense. Correspondente do Jardim São Luís desde 2022.
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