Patricia Lobo fala sobre a importância de investimentos públicos e novas soluções para ampliar acesso ao cinema
Por: Redação
Publicado em 13.11.2017 | 11:11 | Alterado em 13.11.2017 | 11:11
Para a cineasta Patrícia Lobo, recuperar locais públicos da cidade, como escolas, praças e parques, para a experiência de projeções de filmes é uma saída que poderia diminuir a diferença na distribuição das salas de cinema em São Paulo.
Em entrevista ao 32xSP, Patrícia comenta a importância de investimentos em cultura e educação e a participação do Estado para formar público e tornar o cinema mais acessível para a população.
De acordo com dados do Mapa da Desigualdade, em 2016, o distrito com mais salas de cinemas na cidade é o da Barra Funda, com 13 unidades para uma população de 15 mil moradores. E o pior número é o do distrito do Capão Redondo com apenas uma sala para mais de 280 mil pessoas. Em 54 distritos da cidade não há uma sala sequer.
Patrícia mora na região da Lapa, na zona oeste, é formada em comunicação social e pós-graduada em Sociologia pelo Núcleo de Ciências Políticas da PUC/SP. Nascida em São Paulo, ela já morou em Londres.
Aos 35 anos, já publicou dois livros, fez parte de produções teatrais e também atuou por mais de uma década no mercado editorial. Seu trabalho mais recente foi a direção do clipe da música Streets Bloom, do cantor baiano Lucas Santtana, lançado no último dia 7/11, e que mescla imagens das belezas urbanas de São Paulo.
Patrícia também observa os novos meios de consumo e questões orçamentárias que dificultam o acesso ao cinema . “Hoje temos a Netflix, a pessoa paga R$16 a 22 por mês e tem acesso a uma variedade de filmes e séries com qualidade, essa pessoa não vai pagar R$60 (transporte, bilhete, bebida e pipoca) para ter a experiência na sala de cinema tradicional, levando em conta a renda familiar periférica”.
Além dos preços, a localização é outro fator de afastamento do público, para a cineasta: “Tudo se concentra na região mais central e que tenha poder de compra. Tudo infelizmente foi feito para afastar a periferia, é um problema, e é um problema de mentalidade”. Confira a entrevista completa:
32xSP: O que acha da distribuição das salas de cinema na cidade?
Patrícia Lobo: Pouca, existe pouca distribuição, levando em conta o tamanho da cidade de São Paulo. Infelizmente a cultura brasileira é a da televisão, inclusive quando se trata de linguagem. Se você parar para pensar, as grandes cidades da América do Sul têm mais cinemas que nós aqui em São Paulo. Por que isso ocorre? Simplesmente devido as emissoras de tevê poderosas. Elas acabam dominando, é uma questão realmente cultural, mas isso não quer dizer que não devemos ter mais e mais salas de cinema, mesmo porque a nossa produção de filmes está muito efetiva e riquíssima com uma larga escala de produção devido as iniciativas criadas na última década que desenvolveram políticas muito importantes para o segmento audiovisual.
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32xSP: Como você acha que o cinema poderia se tornar mais acessível aos moradores das periferias, onde há menos salas, por exemplo?
PL: O preço para construir salas de cinema é muito elevado, consequentemente, mantê-las com frequentadores assíduos será uma tarefa quase impossível. Como uma parcela muito pequena foi treinada para ter acesso ao cinema, tirando filmes blockbusters, os filmes autorais e com outras linguagens acabam tendo uma procura muito minúscula perto do que eles precisam para manter-se no circuito. Vamos cair novamente na questão cultural, que na verdade as pessoas não têm acesso aos cinemas devido a oportunidade, se existir um preparo, um estímulo desde cedo, é natural que seu olhar se desenvolva e você busque mais experiências cinematográficas durante a vida, mas precisa ser apresentado, desde de sempre, como a leitura, por exemplo.
32xSP: E qual seria a saída?
PL: O que acredito que possa ser feito é uma parceria conjunta do Estado com a iniciativa privada, quando não for completamente do Estado. Acredito que a cultura seja boa parte responsabilidade das autoridades. Todos os grandes cineastas que existem no mundo vieram de estímulos do Estado. O Estado patrocina, deveria ser assim. O interesse de manter o seu povo culto e preparado geração em geração devia ser importante para ele e, creio que a arte faça esse papel. Hoje podemos recuperar os locais públicos da cidade, como a escola, as praças, parques para experiência de projeções de filmes. Também podemos fazer parcerias do Estado com a iniciativa privada como disse anteriormente, caso você tenha um Posto de combustível, pode haver projeções de filmes aberta ao público na comunidade. Não dá só para pensar no cinema tradicional, mas várias outras experiências, como também utilizar as áreas a céu aberto dos prédios comerciais “coberturas”.
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32xSP: E que impacto uma maior acessibilidade poderia ter para o cinema?
PL: Pois é, as salas de cinemas são caras, as tradicionais em si são caríssimas, então sou descrente em relação a aumentarem rigorosamente esse número atual. O que percebo é que com a tecnologia, muita coisa mudou. Hoje temos a Netflix, a pessoa paga R$16 a 22 por mês e tem acesso a uma variedade de filmes e séries com qualidade, essa pessoa não vai pagar R$60 (transporte, bilhete, bebida e pipoca) para ter a experiência na sala de cinema tradicional, levando em conta a renda familiar periférica. É um cálculo fácil. Tudo se concentra na região mais central e que tenha poder de compra. Tudo infelizmente foi feito para afastar a periferia, é um problema, e é um problema de mentalidade. A elite brasileira é assim “tudo para nós, nada para eles”. Sou completamente defensora do cinema, da produção de cinema, da experiência dentro do cinema, mas sei que estamos em outros tempos e existem outras maneiras de estar perto de um filme ou série. Com a questão do streaming, muita coisa mudou. Mas, o cinema sempre existirá, só não consigo acreditar no acesso grandioso devido exclusivamente a uma questão: vontade política.
32xSP: Dá pra mudar esse quadro?
PL: Acho que precisamos mudar, investir fortemente em educação e em cultura, e isso, dentro dos sistemas capitalista e “democrático” que possuímos tem que partir fortemente do Estado como plano número 1 para ter uma nação com mais oportunidades e com mais cidadania e, acredite, naturalmente a frequência nos cinemas aumentarão…
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