Léu Britto/ Agência Mural
Por: Jacqueline Maria da Silva
Notícia
Publicado em 24.05.2025 | 14:12 | Alterado em 26.05.2025 | 17:03
Quando o telefone toca em uma família que aguarda pela adoção de crianças, pode ser um representante da Vara da Infância apresentando uma candidata. Mas pode ser também uma “cegonha”. Esse é o nome dado aos voluntários que se dedicam a ajudar a unir adotante e adotado, em especial se a criança tiver mais de 3 anos.
“A ideia é carregar a criança no bico e levar para a família”, simplifica Cecília Reis, 46, cria de Pirituba, na zona oeste de São Paulo, e que hoje mora em Peruíbe. Ela foi uma “cegonha” por cinco anos e conseguiu levar nove crianças e adolescentes para seus pais. Neste domingo (25) é celebrado o Dia Nacional da Adoção.
Cecília foi voluntária “cegonha” por cinco anos, nas quebradas de São Paulo @Arquivo pessoal
As famílias que pretendem adotar inserem no SNA (Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento) o perfil das crianças que procuram: quantos anos, qual a cor da pele, se é menino ou menina, estado de saúde, histórico familiar e uma série de outras informações.
Como o sistema trabalha com dados, e se algo foge minimamente do perfil indicado pelos futuros pais, uma criança e uma família podem nunca se encontrar. É aí que entram as “cegonhas”, que vão atrás de potenciais famílias, como uma espécie de curadoria.
Foi assim em um dos casos mais marcantes da vida de Cecília. Uma família pretendia adotar uma criança de 8 anos, mas havia um perfil muito compatível, exceto pela idade, que era 10 anos.
“Quando eu liguei e falei do perfil, o casal falou: “quero conhecer”. Mostrei a foto, na hora eles se emocionaram. O menino é a cara do pai adotivo” conta, lembrando que se não fosse pela busca ativa, seria muito difícil o sistema unir pais e filhos.
No Brasil existem pelo menos 33 mil pretendentes ativos no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento. Apenas 2 mil (6%) buscam crianças com mais de 8 anos.
A faixa de menor aceitação é acima de 16 anos (menos de 1%)
Dentre as famílias que se interessam por crianças e adolescentes a partir dos 8 anos, a maioria busca crianças brancas e pardas e a minoria crianças pretas e indígenas.
Apenas 9% das famílias interessadas em adotar crianças ou adolescentes com mais de 8 anos se interessam por quem tenha algum tipo de deficiência.
Pelo menos 5 mil crianças e adolescentes estão disponíveis para adoção no país – cinco vezes menos o número de pretendentes ativos. A maior parte delas (7%) tem mais de 8 anos
Dados se referem a consulta ao SNA, consultados em 7 de maio de 2025 às 17:00
Cecília é psicanalista, especialista em parentalidade adotiva e desenvolvimento infantil. Ela atuou como “cegonha” no Grupo de Apoio à Adoção de São Paulo, uma organização não governamental que existe desde 2005. Em 2019, chegou a assumir a presidência da entidade.
O próprio Conselho Nacional de Justiça considera os grupos de apoio fundamentais para o processo de adoção, como verdadeiros “aliados” na formação de novas famílias, segundo o órgão. Ainda assim, não existe uma estimativa oficial da quantidade de pais e crianças unidos pelas cegonhas.
“Ninguém está pronto, mas tem que estar disponível. O papel do grupo é entender motivações, mostrar a criança e lidar com o maior desafio, que é o desconhecido”
Cecília
Ela milita pela possibilidade de as crianças poderem também decidir pela adoção e escolha de sua família. Atualmente o Estatuto da Criança e do Adolescente, obriga o consentimento apenas do adotando maior de 12 anos.
Apesar da importância dos grupos de apoio, eles ainda são poucos: apenas 200 estão cadastrados no site da ANGAAD (Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção), em todo o país.
Um quarto dos grupos (56) está no estado de São Paulo e somente dez em cidades da Região Metropolitana da capital paulista: Carapicuíba, Embu das Artes, Francisco Morato, Guarulhos, Jundiaí, Mairiporã, Mogi das Cruzes, Santo André, São Bernardo do Campo e São Paulo.
Busque a Vara de Infância e Juventude da sua cidade, ligada ao Tribunal de Justiça. Caso não possua, é possível acessá-la em cidades vizinhas
Leia sobre o tema e conheça outras histórias. Uma sugestão é o documentário “Quando nós nos adotamos”, disponível no Youtube
Busque uma rede de apoio que possa te ajudar no processo: família, amigos e outras referências que fizerem sentido
Tenha em mente que cada processo é único e cada um tem uma história na adoção
A demanda ainda é grande, em especial nas periferias, já que muitos dos grupos acabam optando por atuar nas regiões mais centrais. Desde 2020, o GAASP passou a operar também online, prevendo expansão para cidades fora do estado de São Paulo.
Atualmente, o grupo tem parceria com 18 Varas da Infância do Estado de São Paulo: as 11 da capital e mais sete do interior.
Jornalista, vencedora de prêmios de jornalismo como MOL, SEBRAE, SIP. Gosta de falar sobre temas diversos e acredita do jornalismo como ferramenta para tornar o planeta melhor.
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