Parque Continental teve famílias perderam moradias nos últimos anos; Briga judicial ainda gera incertezas para quem vive na região
Carla Moura/Agência Mural
Por: Carla Moura
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Publicado em 23.07.2025 | 7:39 | Alterado em 22.07.2025 | 21:47
Centenas de famílias que vieram para Guarulhos, na Grande São Paulo, com o sonho de construir a casa própria vivem com a incerteza e o receio de de perder as propriedades. Elas compraram terrenos por meio da imobiliária Continental, mas irregularidades no loteamento, ações e processos judiciais criaram incertezas na vida dos moradores há mais de uma década.
Nos últimos anos, houve protestos contra a imobiliária por conta da reintegração de posse de algumas residências.
Denominado como Parque Continental, o espaço tem uma área de 3,5 milhões de metros quadrados e cerca de 15 mil lotes. Problemas marcam o processo desde o começo.
Segundo entidades que acompanham o caso, há 600 processos de diversas famílias que não conseguem a documentação das casas e a regularização dos terrenos. Outros já sofreram até reintegração de posse, como é o caso da dona de casa Josefina Aparecida Pinheiro de Fernandes, 67.
Ela morava na casa da mãe com a família quando viu uma propaganda da Continental. Josefina decidiu então ir para Guarulhos, ainda na década de 1980, com o sonho de construir a casa própria.

Protesto em 2022 por conta da situação do bairro @Arquivo Pessoal
A dona de casa comprou um lote e morou no Parque Continental por 20 anos, até perder a residência para a imobiliária Continental. Na época, disseram que ela devia R$ 6.000 de impostos.
Josefina diz que o interesse da imobiliária é vender novamente o imóvel ou alugar as casas que foram construídas, e tirar o dinheiro de quem não tem.
‘Faz 11 anos que sofremos a reintegração de posse, ainda dói muito, ficamos sabendo por um oficial de justiça que disse: você tem 15 dias para sair’
Josefina Fernandes, moradora de Guarulhos
Hoje, ela reside em outro bairro de Guarulhos, onde paga aluguel.
O impasse na região já dura décadas e começou com um problema na venda.
O Ministério Público do Estado de São Paulo apontou irregularidades, pois o loteamento foi registrado com 7.452 lotes (com área mínima de 250 m²). Em vez de vender esse tamanho, a imobiliária transformou o local em 15 mil lotes, o dobro do previsto, e ofereceu ‘meio lote’. Segundo o MP, a Continental promoveu “desdobro irregular”.
Anselmo Pires, líder do MLM (Movimento Luta por Moradia), acompanha o caso. Ele explica que quando os moradores entenderam essa situação no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), começaram a questionar o loteamento.
“As famílias tinham que dividir esse IPTU em dois e começou a ter muitos problemas. Alguns pararam de pagar, suspenderam, foram procurar a justiça”, diz.
Com a suspensão do pagamento, advogados da imobiliária pediram a rescisão de contrato com os moradores. Em alguns casos, houve a decisão pela reintegração de posse.
Anselmo também faz parte do Iacom (Instituto Associativo dos Moradores Continental). A entidade foi fundada por moradores dos Parques Continentais em defesa dos direitos das famílias e contra as irregularidades no loteamento.

Audiência na Assembleia Legislativa em 2016. Um projeto de lei chegou a ser feito para proteger as famílias, mas não saiu do papel @Divulgação/Alesp
Em 2014, o Iacom conseguiu com que o Ministério Público de São Paulo ajuizasse uma ação civil pública contra a imobiliária. Na ação, o MP pediu à Justiça que declare a suspensão dos pagamentos à Imobiliária até a regularização completa do regulamento dos loteamentos.
“Permitir que a Imobiliária Continental permaneça recebendo normalmente os valores decorrentes da venda dos lotes ‘significa chancelar prática absolutamente ilegal’”, diz a promotora do caso, em nota divulgada em 2014.
No entanto, o tema ainda é alvo de disputa judicial em torno da regularização dos imóveis, bem como da situação das famílias que compraram os lotes e perderam a posse.
‘Muitas pessoas que saíram dos imóveis, além de perder o bem, ainda saíram devendo prestações, valores altíssimos para a imobiliária’
Os manifestantes também cobram uma fiscalização do poder público, em especial da prefeitura de Guarulhos. Questionada, a prefeitura afirma que houve um acordo judicial entre as três partes, proprietários, Prefeitura e imobiliária Continental para que seja apresentado um projeto de regularização do loteamento.
Segundo Marcelo Lorenzini, ex- presidente da IACON, a ação civil pública que foi movida pelo Ministério Público ainda está em andamento. Segundo ele, foi aberta a possibilidade para que todas as pessoas entrem na ação para defender os direitos pelas moradias.
No entanto, ele ressalta que nem todas as pessoas têm condições de acessar os serviços judiciais. Em alguns casos, a reintegração já foi realizada. A Agência Mural buscou contato com a Imobiliária Continental, mas não conseguiu por meio dos canais da empresa.
Jornalista e correspondente da Agencia Mural. Autora do livro Reveillon das Estrelas e outras Antologias Poéticas. Criadora do Site Parafraseando. É apaixonada por literartura e artes.
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